domingo, julho 24, 2011

ANO VI - Etapa 52

TOUR'2011
EVANS, CONTADOR, SCHLECKs E RUI COSTA

Terminou hoje mais uma edição do Tour e não posso, porque não tenho alternativa, fugir à apreciação que, durante estes últimos dias e, naturalmente, amanhã, a CS veio a fazer e fará.

Foi, de facto, mormente na última semana – mas não só – uma corrida que, mau grado a alteração de alguns dos ‘ingredientes’ a que todos já estávamos acostumados, foi grande atingindo momentos de espectacularidade, quer ao nível desportivo, quer de beleza plástica (e não me refiro às panorâmicas dos milhentos ‘chateaux’ ao longos das etapas) que só o Ciclismo pode proporcionar. Como só o Tour pode proporcionar.

Depois deste preâmbulo, avanço num exercício que pretende destacar alguns momentos, fases ou, simplesmente, constatações – e a minha opinião, claro, enquanto adepto – sem a preocupação de respeitar qualquer cronologia. Até porque perdi várias etapas que não pude ver em directo e até algumas que nem os resumos nocturnos pude ver.

E a CS não ajudou em nada.
Foi insípida, incolor e inodora.
Quem não teve oportunidade de ver na televisão (EuroSport e RTP), quem não teve acesso ao volume de informação que a internet foi debitando e se limitou a ver os jornais… não tem a mínima ideia do que aconteceu neste Tour.

Mas passemos às minhas escolhas…

Tivemos dois portugueses no pelotão e, felizmente, ambos chegaram hoje a Paris.
O Rui Costa, da espanhola Movistar – que, recordo, apesar de ser descendente directa da Reynolds de Perico Delgado, que viria a dar na Banesto de Miguel Induráin e depois, já com menor notoriedade, à Caisse d’Épargne de Valverde, por exemplo – apareceu com uma formação mediana que foi ‘salva’ pelo Corredor da Póvoa de Varzim;
e depois tivemos o Sérgio Paulinho numa anacrónica RadioShack que me confundiu desde o momento em que foram divulgados os Corredores escalados para a Grande Boucle… até ao fim da Corrida.

RUI COSTA. Venceu uma etapa (e que etapa!), a que terminava no alto de Super Besse e, ainda por cima, com o desplante de atacar, no grupo que seguia em fuga, a cerca de seis mil metros da chegada.
Esta vi. Como todos, mesmo os mais visionários que, depois do final da tirada, garantiram que nunca duvidaram que o Rui fez bem em sair de longe. Depois da etapa ficámos todos de acordo, mas que sofri muito e muito, principalmente quando o Vinokourov resolveu fazer pela vida e chegou até ali aos 50/60 metros do Rui – antes de se lhe ‘furarem’ as pernas – fui-me mentalizando para o facto de, agora poder estar a escrever que a iniciativa do português valera apenas pela voluntariedade.
Felizmente não.


O Rui foi enorme e ganhou com classe. Muita classe.
Mas o que me faz, ainda agora, ter este brilho húmido nos olhos é eu ter a certeza de que o Rui é Corredor para nos dar ainda muitas mais – e quem sabe, maiores – alegrias.
E, apesar do que posteriormente fez, nomeadamente na etapa que terminou no Alpe d’Huez, com as subidas do Télegraph e do Galabier ‘coladas’ quando apareceu na frente, só com… Andy Schleck e Alberto Contador, li o epitáfio da sua participação neste Tour.


Especialistas que encaixam perfeitamente naquela definição de que chegam a velhos sem perceber que os 30 anos que têm de experiência não passam, afinal de contas, de um ano de experiência repetido trinta vezes!

Quanto ao Sérgio – e dentro daquilo que vi – só hoje mesmo o detectei na frente (atenção!, não pude ver as etapas todas, como já salvaguardei)…
Quanto ao Sérgio, recomeço, que dizer para além que foi óptimo ter chegado ao fim, sem esquecer que o ano passado foi ele a dar-nos a alegria de ter vencido uma etapa no Tour? Mesmo hoje, quando apareceu na frente foi já depois de o Rui o ter feito, e até ter arriscado uma iniciativa a solo.
Numa RadioShack, demasiado cedo sem rei nem roque, o Sérgio terá ficado à espera que lhe dessem liberdade para escolher uma oportunidade.

Terá sido isso?
Ou, não tendo nada nem ninguém para defender se ‘afogou’, tal como os outros companheiros, na descrença e assumiu que já nada valeria a pena?
Foi pena!

QUEDAS QUE INFLUENCIARAM. Não me lembro de nenhuma Corrida que tivesse ‘mandado para casa’ tanta gente importante no pelotão – alguns até com legítimas pretensões – como o Tour deste ano. E isto conduz-me directamente para uma constatação imediata: a Organização não mediu as eventuais consequências de fazer passar um pelotão de 200 Corredores por estradas com pouco mais de três metros de largo.

Curiosamente, não li uma única crítica em relação a isto.
Aqui há meia dúzia de anos, mais um ou dois, figura proeminente, no panorama nacional, natural da Região – o que não o obriga, é evidente, a ser conivente – ‘arrasou' a Organização da Volta ao Alentejo porque fez passar o pelotãozinho de pouco mais de uma centena de Corredores por estradas municipais que não eram mais estreitas que aquelas que, pelo menos até à chegada aos Pirenéus o pelotão deste Tour sempre andou.
Aliás, até mesmo os Corredores do pelotão nacional, depois de ‘habituados’ a fazer etapas inteiras em IP’s ‘rabeiam’ quando é necessário, para chegar a algum lugar que endureça qualquer Corrida, ter que se recorrer a estradas municipais.

O drama, não assumido, pela Organização do Tour, em relação à edição deste ano, é que naquelas estradinhas – por muito bom que fosse o piso – ficaram, não digo que candidatos indiscutíveis à vitória final, mas, pelo menos, Corredores que poderiam ter ‘mexido’ com a Corrida de outra forma.

Recorde-se que o próprio Alberto Contador perdeu quase um minuto e meio para os Schleck logo no primeiro dia da prova.

CONTADOR. Quem, de facto, gosta de Ciclismo, ama a Modalidade, não pode ter ficado indiferente ao ‘caso’ Alberto Contador.
Há outros exemplos, até mesmo domésticos mas, como se diz no meu Alentejo, o mínimo que os figurões da AMA, da UCI e quejandos… aqueles que comem da mesma gamela e, encobrindo, com a conivência de alguns, os vícios privados, querem convencer-nos das suas públicas virtudes, 'fizeram-lhe a cama' e sacudiram as mãos.

É desumano o que estão a fazer, já não digo ao Corredor mas ao Homem.

Depois do Tour do ano passado – que, creio, ainda não foi homologado – mantêem-o como ‘suspeito’.
24 horas do arranque da Volta ao Algarve deixam-no saber que, afinal, pode correr e ele é obrigado a uma maratona indescritível, que acabou com uma corrida de táxi do Aeroporto de Lisboa até à partida da 1.ª etapa da Algarvia.

Protelam a decisão quanto à sua inocência. Ou não.
Deixam-no correr o Giro, que ganhou de forma superior, e a alinhar à partida do Tour. Tudo isto pode ter sido em vão. Depende da decisão ainda por tomar pelos mangas de alpaca.

Foi, psicológica e emocionalmente ‘agredido’ na apresentação do Tour ao ser recebido por um ensurdecedor coro de assobios; perdeu tempo, devido a queda, logo na primeira etapa quando ainda acusaria a ‘calorosa’ recepção da véspera e na subida para o Alpe d’Huez é provocado por um desqualificado qualquer que, travestido de enfermeiro, esguichou para o seu rosto o conteúdo de uma seringa.

A ‘mensagem’ era óbvia. Pena que o soco que Contador lhe aplicou não tenha sido suficiente para lhe partir todos os dentes. Nem sequer o fez cair. Com um bocadinho de sorte seria atropelado.

EU queria ver aquela aventesma, que tinha tudo planeado, passar dois ou três meses com uma perna partida.

E a CS, uma vez mais, ou ‘não viu’ ou criticou o Corredor.
Também mereciam um murro nos dentes!

CINCO. Depois da vitória do belga Philippe Gilbert (Lotto) na primeira etapa, ganhando o direito de sair para o segundo dia de amarelo, só mais quatro homens envergaram o símbolo de líder e, dois deles, para além de a terem conquistado de forma não esperada, foram uns heróis ao conseguir mantê-la para além daquilo que os observadores especialistas ousariam prognosticar.

O norueguês Thor Hushovd (Garmin), reconhecidamente um especialista nos sprints – pese embora ostente a camisola de Campeão do Mundo de fundo – vestiu-a no segundo dia, num crono por equipas e passou com ela os Pirenéus.
Ao todo, andou oito dias de amarelo, contando com o primeiro de descanso.

Depois, e para alegria dos gauleses, foi Thomas Voeckler (Europcar) a vesti-la no final da 9.ª etapa e defendê-la com unhas dentes, e tudo o mais que pudesse agarrá-la, até ao Alpe d’Huez. Onze dias, contando com o segundo de descanso.

No Alpe d’Huez, quando Alberto Contador atacou a mais de 90 km da chegada, logo na subida para o Télegraph, Andy Schleck subiu ao céu, mas os erros que cometera – ele e a equipa – tanto nos Pirenéus como nas duas etapas anteriores, nos Alpes, devem ter-lhe logo ‘dito’ que a glória seria efémera.

REVOLUÇÃO NAS PONTUAÇÕES DA REGULARIDADE E MONTANHA. Se alguém que esteja agora a ler-me e não pode ter oportunidade de ver nenhuma etapa na televisão, então nada sabe sobre isto porque os jornais o ignoraram. E não era, de todo, para ignorar.

A Organização do Tour resolveu, este ano, revolucionar por completo a forma de pontuação dos corredores mais regular (camisola verde) e melhor trepador (a tradicional camisola às pintinhas vermelhas). Assim, acabou com as tradicionais (duas ou três) ‘metas volantes’, que tinham uma classificação própria mas que também pontuavam para a regularidade – é questionável, é sim senhor – e instituiu um único sprint intermédio que dava tantos pontos como a chegada.

A Volta a Itália teve, durante anos, o Intergiro, com a diferença que esta meta ordenava uma classificação autónoma, com um vencedor autónomo do da regularidade.
Era uma espécie de duas etapas numa só.
A primeira acabava na meta do Intergiro – e premiava os mais teimosos que não se escusavam a entrar em fugas – e a segunda na linha de chegada que contava para a geral individual quando o líder do Intergiro ainda vinha a dez quilómetros da meta mas já tinha defendido a sua camisola.

Ora, e não tenho prurido nenhum em me ‘colar’ à opinião do nosso melhor comentador de Ciclismo, o Marco Chagas (RTP), esta experiência falhou redondamente.
Pior!... Foi até motivo de algumas cenas menos dignas com desclassificações pelo meio devido a comportamentos incorrectos.
Eu não advogaria a sua continuidade.

Quanto ao novo modelo da pontuação para o Rei da Montanha… foi mais ajuizado mas precisa de ser corrigido.
Por exemplo, as contagens de 4.ª categoria – mesmo que a definição das mesmas deixem a descoberto que seriam uma subidinha até aos 500 metros de altitude (na maioria das vezes, a começas nos… 350 metros acima do nível do mar) e com quilómetro e meio ou dois de extensão - darem apenas pontos (dois) ao primeiro a passar é ridículo.
O que é que se pretendia?
Transferir para as contagens de montanha menores os sprints das antigas metas volantes?
Mas estas davam pontos aos primeiros três!

Também a drástica redução da pontuação nas montanhas de 3.ª, 2.ª e até de primeira categoria convinha que fossem repensadas.

Já o facto de as chegadas em alto, fossem de 1.ª categoria ou de categoria especial valerem o dobro dos pontos das ‘irmãs’ a meio da etapa creio ser pacificamente aceite.

Custava ver os grandes trepadores, porque só tinham quatro ou cinco chegadas em alto, verem ser coroados como ‘rei da montanha’ homens como, por exemplo, Richard Virenque – que creio ser ainda o recordista de mais vitórias consecutivas na montanha – nunca ter ganho uma verdadeira chegada em alto.

Limitava-se a ir somando pontinhos nas 4.ªs, 3.ªs e 2.ªs categorias (às vezes) para garantir o número suficiente de pontos para bater quem ganhava, de facto, na alta montanha.

EVANS. Os últimos são sempre os primeiros.
O australiano, sustentado numa equipa coesa e com verdadeiro espírito de entreajuda e sacrifício, ao segundo dia ficou a um segundo da camisola amarela. Contador estava mais de minuto e meio lá para trás e os irmãos Schleck ainda agora estou a pensar… no que pensavam.

Tremendamente feliz é a frase do Carlos Flórido (O Jogo) quando escreveu que o australiano, e cito de memória, “Não é o melhor em nada mas é bom em tudo”.
Muito bom, atrever-me-ia a acrescentar.

Não vou abrir mais um espaço para os irmãos luxemburgueses, sai tudo aqui.
Que lhes aconteceu?

Não creio que tivessem que respeitar uma hierarquia, como hoje li.
Franck, o primeiro a atacar – e a deixar em maus lençóis o Contador – caiu a pique e, hipoteticamente, havendo qualquer estratégia para levar, este ano, o mais velho à vitória (porque Andy ainda tem muitos anos para o conseguir) logo que se sentiu mal deveria ter dado ‘roda livre’ ao mano mais novo.

A minha leitura – e escrito agora, depois de a prova ter terminado, pode parecer a verdade de Pilro – é a que eles se preocuparam muito com a árvore (Contador) menosprezando a floresta (Evans).
Ou que, quando deram por isso já era demasiado tarde.

Volto a frisar a minha opinião: Alberto Contador, para além de já trazer nas pernas o Giro, que venceu de forma categórica, não pode não ter acusado, emocionalmente, a forma hostil como foi recebido em França. E nunca teve equipa que o ajudasse!

Contra este don Quijote psicologicamente debilitado os Schleck só tinham uma coisa a fazer: ‘descarregá-lo’ logo ma primeira dificuldade que aparecesse e, volto a lembrar, ele perdeu logo minuto e meio na primeira etapa.

(Faz-me lembrar aquela anedota do tipo que pedia a deus, todas as semanas, que lhe saísse a lotaria, até que deus, já irritado, lhe gritou ‘lá de cima’: “Porra! Ao menos compra uma cautela!...)

Se não acredito numa ‘guerra’ entre ambos, estou convencidíssimo que estavam tão obcecados com o espanhol que não ligaram a Cadel Evans.
Que até andou uma ‘eternidade’ em segundo lugar a… UM segundo do líder, então o norueguês Thor Hushovd.

O curioso é que o australiano chegou a queixar-se em declarações que são públicas e foram reproduzidas pela imprensa.

Algo do género: ‘Não estou para carregar os Schleck às costas até Paris!”

TERMINANDO. Depois das condições, e estou a repetir-me, psico-emocionais com as quais Alberto Contador teve que lidar neste Tour, eu, que até nem sequer era seu admirador, dou o braço a torcer. Ganhou um novo admirador.

Cadel Evans, por aquilo que fez – e recordo aqui as ajuizadas palavras do João Pedro Mendonça, esta tarde na RTP – foi, de facto o Mais Regular nesta Corrida, embora o Cavendish tenha ganho o prémio, e foi o mais que justo vencedor da prova.

Agora, aqui, confesso humildemente que nem sequer sei qual é a estrutura da sua equipa. Quem é o DD, mas todos merecem este triunfo.

Contador esteve quase sempre sozinho.
Os Schleck guardavam um ou dois companheiros, pelo menos até ao início das partes mais difíceis das principais etapas, mas o Evans esteve sempre rodeado de uma fiel ‘guarda de honra’.
E isto ajuda a perceber porque ganhou.

8 comentários:

Rui Quinta disse...
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mzmadeira disse...
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mzmadeira disse...
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Rui Quinta disse...
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manuel amaro disse...
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Ricardo Ferreira disse...
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aamorim disse...
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mzmadeira disse...
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