sábado, janeiro 10, 2009

II - Etapa 304

NEM OS PROGENITORES FORAM AO "ENTERRO"!...

O famigerado ProTour foi enterrado sem pompa nem circunstância. A sua morte, há muito prevista, terá acontecido em paz. Provavelmente durante o sono. Foi-se. Não deixa saudades e nem sequer consta que os seus progenitores o tenham acompanhado à última morada.

Pelo contrário, e da forma usualmente farisaica como se têm movido nos últimos cinco a seis anos, os pais da besta apareceram no final da semana muito satisfeitos com o facto de... o Calendário Mundial ter sido reunificado. Eles, os mesmos que o retraçaram, criaram uma coisa irreal, plantéis de 30 corredores, a obrigar a orçamentos loucos de dezenas de milhões de euros, muitos deles. Ora, quem investe tanto pede resultados; para se conseguirem resultados... exactamente.

Nem vale a pena prosseguir, todos entendem.

Ao mesmo tempo, obrigados a subdividir-se em mais do que uma frente, as principais equipas aceitavam os convites de algumas – ainda na altura – grandes corridas, para depois apresentarem um segundo ou terceiro conjunto, defraudando as expectativas dos organizadores e, pior ainda, irritando os patrocinadores que se sentiam enganados... pelos organizadores que não tinham culpa.

E quantas corridas desapareceram do calendário nestes últimos cinco anos?
Algumas delas com história, como sabem.

Logo no final do primeiro ano da experiência se percebeu que a ideia pecava por pouco madurada. Houve demasiada pressa em salvar algumas peles e para que essa meia dúzia se salvasse, sacrificaram-se dezenas de outras.

De organizações a equipas.
Quantas desapareceram nestes últimos cinco anos?

Estou à vontade porque desde a primeira hora me posicionei contra aquilo que não foi mais do que uma tentativa de assalto ao pote do ouro, só que feita por amadores, quando os donos do pote eram, são, organizações tremendamente bem oleadas, poderosas, com fortes influências.


Quem é que ficou admirado com o facto de três organizadores apenas terem feito frente à UCI, terem rido das ameaças feitas por esta, terem cedido o mínimo que queriaM ceder para, quando, tendo dado a mão perceberam que lhes queriam agarrar o braço pura e simplesmente romperam as intenções de cooperação?

Eles, os ricos, sujeitarem-se ao ridículo ataque de candidatos a novo-ricos, presunçosos mas sem ideias nem... obra feita. Que queriam, em espécie de golpe palaciano, instalar-se nos grandes cadeirões que, naturalmente, os seus detentores defenderam com as armas que tinham. A força dos milhões que geram e fazem gerar, o que os liberta de qualquer traiçoeiro abraço de uma qualquer anaconda.
E saltaram fora.


E as equipas fizeram orelhas moucas às histéricas ameaças gritadas de Aigle. E, como era evidente, nem chegou a haver confronto porque as armas estavam, estiveram sempre, do mesmo lado.

Mas, teimosamente, houve quem tenha resistido até ao fim na defesa do indefensável. O ProTour morreu em data incerta, há dois ou três anos lá para trás. O enterro aconteceu agora, pela calada, como se enterra um indigente. Tudo de que a Sociedade se envergonha.

E as corridas desaparecidas – este ano é a grande Volta à Comunidade Valenciana que está em risco, para não tomar já como certo o anúncio de que não se vai realizar mesmo?
E as equipas que desapareceram?

E as que sobrevivem de forma artificial?
Não, não me estou a referir em concreto ao pelotão português.

Aqui ao lado, em Espanha, não fora a intervenção, em termos orçamentais bastante significativa das Regiões Autonómicas, aquele que será, actualmente o Ciclismo mais forte do Mundo – ganharam quase tudo o que de mais importante havia para ganhar, das três grandes aos Jogos Olímpicos, lembram-se? – poderia estar ridiculamente equiparado ao português. Digo ridiculamente sustentado na abissal diferença de potencial económico entre os dois países.

Entretanto, e enquanto ia perdendo o braço-de-ferro com as três grandes organizações, a UCI virou-se para a parte mais fraca desta cadeia, os Corredores.
Em nome de uma transparência que só os cínicos podem publicamente defender, porque todos sabemos que, e insisto, não é só no Ciclismo mas em todas as modalidades de Alto Rendimento, sempre houve doping, há doping e haverá sempre doping.

O mais certo, e estou ainda esperançado que, nomeadamente cientistas que se venham a debruçar sobre o fenómeno, com a ajuda clara e sem receios dos médicos, repito-me, que acompanham atletas de disciplinas de Alto Rendimento, do Ténis à Natação, do Atletismo de velocidade ao Atletismo de Fundo e do Futebol, sim... do Futebol, assumam a definição e a sua pública defesa daquilo que, nos dias de hoje e tendo em conta o que se pede aos atletas - não raro, em actos elevados ao insustentável peso de "defesa da honra nacional" - é, de facto, doping.

Ainda hoje se fala dos campeões-proveta fabricados na ex-RDA. Nunca se atreveram a insunuar o mesmo em relação à ex-URSS porque? Porque os grandes Estados Unidos faziam, e fazem, a mesmíssema coisa. E hoje em dia, ainda que mais ou menos disfarçadamente, aponta-se o dedo à China. Mas as qualidades dos jamaicanos são endógenas... Repito, é tão grande o cinismo neste campo que, quem quiser ser honesto para consigo próprio, e só assim o poderá ser em relação a terceiros, o melhor que tem a fazer é ficar calado.

Ao longos das últimas décadas tudo mudou. Desde os apetrechos, sejam bicicletas, sejam as simples bolas de futebol, até aos métodos de treino... e insiste-se numa lista de produtos proibidos elaborada empiricamente.

E o que aconteceu nos últimos anos no Ciclismo, não tenham dúvidas, resultou de uma guerra de bastidores entre as duas facções em que a criação do ProTour dividiu o Modalidade e que penalizou, principalmente, para não dizer unicamente, os Corredores.
Salvo uma ou duas excepções.

Desceu-se tão baixo, nesta procura de resultados – de sinal diferente, claro, quem o não percebeu? -, com as organizações de corridas a lutarem por manter o espectáculo ao seu nível e as organizações de... defesa da saúde dos atletas a fazerem tudo para descredibilizar esse espectáculo esfalfando-se por descobrir batota em tudo o que era corrida – que se atropelaram até direitos fundamentais de todos os Homens, como o Direito à Privacidade (obrigatoriedade de informarem onde estavam 24 horas por dia, 365 dias por ano) e o Direito ao Bom Nome, com acusações (pelo menos ainda) não provadas.
Mas siga a tropa!

Volto a ver que todos estão agora felizes. O Calendário Mundial foi reunificado, a UCI voltou a andar de braço dado com os, até há pouco, arqui-inimigos (retomou a boleia que eles lhe dão, é o que é!...) e, aparentemente... não aconteceu nada!

Termino remetendo-vos ao artigo anterior a este. À carta do Cédric Vasseur... Leiam-na quantas vezes for preciso para a compreenderem.

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