sábado, janeiro 07, 2006

Flash-back 1


Acontece-nos a todos, mais tarde ou mais cedo. Vamos juntando recortes, informações em avulso e, algum dia há-de acontecer a conjugaçao vontade-tempo para organizar velhos testemunhos (preciosos pedacinhos que nos ajudam a ir escrevendo a história do ciclismo em Portugal). Hoje mesmo, de um amontoado de papeis empoeirados salvei algumas dezenas de folhas que vou manter... até à próxima arrumação.

Dizia o "Correio da Manhã" de 11 de Janeiro de 1998 (oito anos passaram, entretanto): "GP Torres Vedras ultrapassou Volta a Portugal". Falava-se da classificação que a UCI atribuia às diversas provas. Com algum destaque, uma foto do homem forte da organização da Volta, à altura, servia para ressalvar: "Serafim Ferreira não se conforma com a pontuação atribuída á Volta a Portugal". A dado passo, na prosa assinada por um dos mais carismáticos jornalistas de ciclismo, em Portugal, o meu caro amigo Guita Júnior, lia-se: «... seria de toda a justiça, na hora dos comissários darem pontuação aos diversos aspectos das organizações não aplicarem a mesma bitola (...) pois o grau de exigência para Portugal não deveria ser igual ao adoptado, por exemplo, para a França, Espanha ou Itália.»

Homem há mais de 50 anos ligado ao ciclismo, o amigo Guita julgava que, com a sua opinião, poderia aligeirar as falhas que estavam na origem das notas baixas dadas às corridas portuguesas. Pretendia ele, naquela altura - como tantas vezes eu próprio o fiz - esconder (quase justificar) as falhas primárias de uma organização que primava pelo autismo de se julgar acima de qualquer crítica... pois se até tinha um director-de-corrida-adjunto cujo único papel era o de "acompanhar" os comissários internacionais, desde que se levantavam até irem para a cama, depois de terem comido nos melhores restaurantes, visitados os locais nocturnos mais in e... se o não recusassem, terem jovem, fresca, agradável e feminina companhia para... todo o serviço.

O CM não falava nisto. NINGUÉM falou nisto embora todos o soubessem. O engraçado... (substituam por triste, se fizerem favor) é que a resposta à pergunta que todos, na altura, terão feito e que ficou a pairar no ar (porque é que a Volta teve uma pontuação má?), foi dada 13 dias depois no Jornal O JOGO, numa notícia de página inteira mas que não apareceu assinada. O título era: VOLTA SEM... WC!...

A classificação da nossa Volta fora PIA ABAIXO por falta de... urinóis! Era a grande verdade. (O aluguer, que já era possível, desses WC descartáveis, seria, porventura, mais caro que o das meninas... é uma mera especulação da minha parte, porque não faço ideia de quanto custava alugar dois WC de plástico!...)

Embora sem ter a peça assinada, O JOGO mostra tudo numa espectacular foto do Jorge Monteiro. Prédios de habitação (impossíveis de identificar), dois recantos, três corredores - um da TVM, outro da Artiach e um terceiro da Janotas&Simões - a aliviarem-se contra a parede das casas das gentes que, se calhar até gostavam de ciclismo, não achariam era muita piada ao facto de as ervas junto à parede amarelecerem de um dia para o outro e de a comunidade de mosquitos residentes crescer no mesmo espaço temporal.

Mas O JOGO trazia mais.
Das provas internacionais, à altura, o Troféu Joaquim Agostinho foi o melhor classificado: nota 90,75; a Volta vinha em segundo lugar (84,75), o GP Portugal Telecom teve 84,25 e a Volta ao Alentejo 83,75. O GP Jornal de Notícias foi o mais penalizado. Teve apenas 78 pontos. O curioso foi que, com a excepção do Troféu Joaquim Agostinho, todas as outras tiveram, como UM dos pontos a valerem nota negativa a FALTA DE WC NA ZONA DE PARTIDA!

Ah! e na Volta, para além do "regulamento particular não conforme com os regulamentos UCI" - era uma corrida 2.3, à altura -, logo a seguir vinha a implacável estocada que acabava com todas as pretensões: "veículo do director de corrida (leia-se: organização) mal colocado"!!!!

Para quem não consegue acreditar, garanto que é verdade.
A principal prova velocipédica nacional levava notas negativas, porque não tinha onde os corredores pudessem mijar... e porque o director da organização NUNCA abriu mão de... abrir a corrida, ignorando os regulamentos.

Isto foi em 1998. No ano seguinte, em concurso público a FPC entregou a organização da Volta a outra entidade. O mesmo director de organização ainda andou á frente da corrida até 2000 e até mandou parar três corredores que, numa última etapa de uma Volta, iam escapados ao pelotão. Porque... naquele dia não era para haver fugas.

Felizmente (porque um dia podem fazer falta para contar a História da Volta a Portugal em Anedotas) tenho esse momento gravado em vídeo. Os corredores, todos estrangeiros, pararam, de facto, e abandonaram a corrida como forma de protesto. O vídeo (gravado da transmissão da RTP) mostra a seguir o Director da Organização a beber champanhe, fazendo a garrafa passar de carro em carro...

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