terça-feira, julho 20, 2010

ANO V - Etapa 74

O 'FAIR-PLAY' É UMA TRETA

Quem o disse foi, aqui há dois anos, o Jorge Jesus que, como todos sabem, mesmo sendo um predestinado nunca conseguiu deixar de ser um Homem do Povo, no sentido de Simples, até com pouca cultura. São famosas as suas 'calinadas'.

Mas sabe o que faz e sabe do que fala como poucos.

Isto a propósito do acontecido (já) ontem quando Alberto Contador SE APROVEITOU de um azar do seu mais directo adversário (na altura as posições eram inversas, era ele o mais directo adversário), o jovem luxemburguês Andy Schleck.

Na etapa anterior - estive os dois dias de folga, logo não deixei de acompanhar as etapas - o natural de Pinto tentou por três ou quatro vezes por à prova as capacidades do rival. Sem sucesso. Aliás assistimos até a uma cena que não é de todo inédita, não para quem andou 15 anos no pelotão...

Se Schleck se limitava a ir na roda e a responder aos seus ataques, Contador, mais experiente, 'desligou' e deixou-o ante um dilema (era bluff, é evidente, mas há jogos que se ganham assim)... mantinha-se atrás do espanhol e deixava fugir os terceiro e quarto classificados ou, meu amigo, mandava às malvas o 'chico-espertismo' (embora aqui até no bom sentido, era a Contador que competia atacar) e tinha que dar à perna, levando o rival, para que as coisas não se complicassem na frente.

Tudo normal.
Não há manuais escritos sobre a forma de comportamento na estrada, mas todos o sabemos de cor.

Isto foi no Domingo...

Ontem, mais uma vez, espanhol e luxemburguês apareceram colados como siameses.
Como seria natural, até porque nada mudara, continuava o ónus da iniciativa a pertencer a Contador...

Contudo, até foi Schleck o primeiro a abrir as hostilidades.

Contador ficou-se nas covas e foi o cazaque Alex Vinokourov a responder, pelo menos para que o luxemburguês não deixasse de sentir na nuca o bafo de um 'astana'... enquanto Contador não reagisse.

E o que aconteceu?

Andy Schleck, de repente, e estas coisas acontecem assim, inesperadamente, tem uma avaria mecânica, 'chavão' que serve para qualificar uma série de azares.

Concretamente, ao querer mudar de andamento, fosse lá pelo que fosse, a corrente soltou-se do prato dianteiro. Nervosismo imediato, e compreensível, tentativa de remediar, em andamento, o problema, incapacidade para tal e necessidade de ter de parar para, à mão, recolocar a corrente nos carretos. Trinta segundos perdidos.

É o que é que acontece nesses trinta segundos que podem ter decidido a corrida?
Depois de 'abafado' pelo luxemburguês, Alberto Contador ganhou asas e ala que ai vou eu!...

Que não, que não se apercebera da avaria do rival - que, recordo, segundos antes o deixara pregado no dobrar de uma viragem, ainda a subir - e, aproveitando a boleia de todos os que apareceram na frente, lança-se descida abaixo, passe o pleonasmo, acabando por ganhar 39 segundos a Schelck, os trinta e um que tinha de desvantagem, aos quais somou oito a seu favor.

E a primeira reacção foi a de que não se apercebera da avaria do rival.
Ai, pois não.
E para que serve o pinganillo?!!!

Ninguém, porque é impossível mudar os factos, poderá querer reescrever a história daquela parte final da etapa.

Facto: Schleck atacou e só Vino o acompanhou...
Presunção de facto: Seria apenas e só mais um teste às forças de Contador?

Facto: O luxemburguês sofre uma avaria mecânica e, de repente, Contador 'ganha asas'...
Presunção de facto: Podia o espanhol saber se o rival ia perder 5 ou 30 segundo? Não!

Facto: Nos segundos/minuto que se sucederam, Contator não parou de olhar para trás. Tentava perceber onde tinha ficado o adversário...
Presunção de facto: Percebendo que Scheleck tardava a reaparecer, o que deixava adivinhar uma situação mais complicada, deveria, pelo menos, ter refreado o ritmo?

Facto: Os outros seus dois mais directos rivais nunca deram mostras de o querer fazer... (é a única parte que abona a favor de Contador!)

Facto: Atabalhoamento ou por real dificuldade em solucionar o seu problema, o Camisola Amarela perdeu ali a liderança... provavelmente a Corrida.

Facto: Contador não ficou de consciência tranquila tanto que, segundo o que hoje mesmo li, depois de começar por afirmar que não se apercebera de nenhum problema com Schleck, o espanhol voltou atrás para lamentar o azar do seu rival....

Deveria ter feito outra coisa que não aquilo que fez?
Quem lho pediria? Estamos a falar de uma Volta a França... de uma Corrida em que ele, Contador, é o principal favorito.... e não tem culpa nenhuma do azar que bateu à porta do seu adversário mais directo.

Esperar por ele?
Deixemos-nos de romantismos...

Ainda se fosse na primeira semana de corrida - e aconteceu, e, pelo que li, terá sido o próprio Contador a 'dar ordem' para que o pelotão aguardasse pelos atrasados, depois de uma queda colectiva onde, ironia das ironias, estava Andy Schleck - mas estávamos nos Pirenéus, à entrada da última semana de corrida....

Teria o Schleck esperado pelo Contador, se os papéis tivessem sido invertidos?
Nunca o saberemos....

Isto tudo para, e voltando ao princípio, ao Jorge Jesus, reconhecermos que isso do fair-play, em alta competição, é mesmo uma treta!

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