sábado, março 15, 2008

1110.ª etapa

O CICLISMO HÁ-DE VENCER

Primeira nota introdutória: este artigo NÃO é uma resposta ao do Carlos Flórido, que saiu na edição de hoje de O JOGO.

Segunda nota introdutória: o Carlos regressou às modalidades, agora - creio não estar enganado - com funções de (ainda) mais responsabilidade. Uma boa notícia para, por exemplo, para o Ciclismo. Uma aposta que a concorrência não devia deixar passar em claro.

Desentendimentos, sempre a nível de opinião, porque a minha admiração por ele nunca esteve em causa, chegaram a pôr-nos em lados opostos de uma imaginária barricada. Mas porque, apesar de ser míope... tratei-me, nunca deixei de o considerar o Jornalista português mais bem informado sobre TUDO o que se passa com a Modalidade que nos une.

Deixados os entretantos, passemos aos finalmentes.

O Carlos Flórido dedica o editorial - deixem-me chamar-lhe assim - que abre a Secção das Modalidades no seu jornal à guerra palaciana entre a União Ciclista Internacional e a Amaury Sport Organisation (vulgo: ASO).

Tem razão. Há, de facto, manobras de guerrilha entre as duas partes mas, não fossem as pretensões hegemónicas da UCI e nada disto estaria a acontecer.

Claro que, no exercício das suas funções no seu jornal, o Carlos tem de obedecer a regras às quais, sendo o VeloLuso apenas um Blog não tem de respeitar.

No meu regresso - que está para muito breve, posso adiantar - também me sentirei de alguma forma constrangido em escrever exactamente o que penso porque, a partir do momento em que o suporte da minha opinião passe a ser o Jornal, tenho a obrigação de o não imiscuir naquilo que pode ser só a opinião do cidadão-adepto do Ciclismo.
Compreendem?

Isto para eu justificar a mim próprio o meio caminho por onde andou a opinião do Carlos.
Para ele, há culpas de parte a parte. Acho que o escreveu em consciência.
Para mim, e como já tive oportunidade de aqui escrever, parafraseando, aliás, palavras proferidas na minha presença pelo doutor Artur Moreira Lopes, presidente da União Velocipédica Portuguesa-Federação Portuguesa de Ciclismo, as associações servem para coordenar as actividades dos clubes nelas inscritos; a federação existe para coordenar as associações e, no que respeita aos Profissionais, a FPC não tem que se imiscuir com o que fazem as Organizações. Não mais do que chancelar as suas corridas que, obrigatoriamente, pelos regulamentos, têm de ser presentes ao órgão máximo da modalidade.

Ora, isto é facilmente transponível para o patamar superior.
E se acharem que não, tentem explicar-mo.

As federações servem para coordenar a modalidade nos respectivos países; a UCI serve para coordenar as diversas federações e não vislumbro nos seus estatutos - que qualquer um pode ler - a hipótese de ela se transformar em organizadora de corridas.

A não ser os Campeonatos Mundiais, tal como as federações nacionais têm à sua a responsabilidade de organizarem os Campeonatos de cada país.

Mais, os Campeonatos da Europa, nas categorias em que se disputam, são da responsabilidade da União Europeia de Ciclismo (UEC) que, esta sim - em representação das associações de ciclismo dos países europeus - tem lugar na Assembleia-geral da UCI.
Como as outras federações ou confederações continentais.

Por tudo isto, a minha opinião é a de que a UCI não tem nada que se pôr a organizar corridas.

E a verdade é que nunca as realizou nem tem ideias de o fazer. Criou foi um fantasma chamado ProTour, cujas corridas que preenchiam o seu calendário continuaram a ser organizadas por quem sempre as organizou, com apenas um pequeno pormenor a alterar as regras do jogo.

Porque a ideia do ProTour nasceu nos corredores de Aigle, a UCI reivindicava, não só uma fatiazinha do bolo mas os direitos internacionais sobre a receita do dito bolo.
Que ela não inventou.

As organizações continuavam a ter que investir - para isso continuavam a ter que ter o trabalho de angariar patrocinadores - mas na hora da distribuição dos dividendos, a UCI abocanhava parte significativa.

Passe a imagem - que pode ser chocante - as organizações, que sempre deram o corpo ao manifesto e sempre correram todos os riscos, passavam a fazer o papel de putas.
E a UCI a de chulo.

As mais rameirosas, mais dia menos dia caíam, abandonadas pelo chulo que pouco ou nada ganhava com elas; as de maior charme, aquelas que até aí faziam rios de dinheiro em contactos directos, tinham de passar a pagar ao chulo.
Na melhor das hipóteses... alugar quarto no hotel explorado pelo chulo.

Contem a história da maneira que quiserem... a moral da mesma é esta.
Nua e crua.

Ao contrário do que o Carlos escreve, o ProTour não visava - porque isso é inexequível - retirar peso ao Tour.
O Tour é o Tour.
E basta por-mos as palas e ver só o que está à frente dos nossos olhos para que ninguém fique com a mínima réstia de dúvidas de que, quando um responsável - ou candidato a isso - por uma equipa portuguesa tenta convencer um patrocinador, não lhe vai prometer que vai fazer boa figura na Volta ao Algarve, lutar pela vitória no Troféu Joaquim Agostinho ou limpar a concorrência no GP Abimota.

Promete-lhe, é evidente, visibilidade na Volta a Portugal.

E isto acontece ao mais alto nível.
Basta substituir Volta a Portugal por Tour.

E que ninguém tenha dúvidas de que - como o Carlos lhe chamou - o calendário ASO esmaga, reduz à mais ínfima percentagem, o Circuito ProTour. Porque é com a possibilidade de estar no Tour - só os Jogos Olímpicos e os Mundiais de Futebol o ultrapassam em número de telespectadores a nível global - que as empresas arriscam capitais para patrocinar equipas de Ciclismo.

As Clássicas da Primavera são importantes? São.
O Giro é incontornável? Será.
A Vuelta ganhou estatuto? Ganhou.
Mas toda a gente quer ir ao Tour.
E a ASO pode pôr e dispôr.

A UCI ameaçou as equipas ProTour que se apresentassem à partida do Paris-Nice despromovido, por casmurrice da UCI, a corrida do calendário interno francês.

A ASO, sem vir para os media dizer isso, fez passar a mensagem de que, quem não aparecesse nesta corrida esquecesse o convite para o Tour.

Resultado...
Vejam na internet. Ou nas breves que os jornais dão.
Terá sido por acaso?
Claro que não.

Por isso, não há guerra entre a UCI e a ASO porque não pode haver.
Mas em Aigle são manhosos, traiçoeiros, perigosos. Como os cães que não ladram.
Atacaram a Associação Internacional de Grupos Desportivos, cortando relações institucionais.
Mas é apenas o canto do cisne. Se é que sabem o que isso significa.
Exactamente.
É mais fácil cair a UCI que a ASO.
Por isso a RCS e a Unipublic não hesitaram em cerrar fileiras junto com organizador francês.

A NBA - e já dei este exemplo milhentas vezes - está de fora da jurisdição da Federação Internacional de Basquetebol.

A qualquer momento se pode criar uma qualquer entidade que passe a supervisionar o Ciclismo de Elite fora do âmbito da UCI.

E isto pode até nem acontecer porque em Aigle recuarão o quanto, quando e onde tiverem que recuar, para não ficarem apenas a supervisionar as federações vazias de equipas de topo que, sem hesitações, aderirão a qualquer modelo que as alivie da pressão psicológica de uma UCI cada vez mais ridícula.

E a luta contra o doping, com a chancela da UCI é outra mentira.

Apenas visa cobrar às equipas verbas exorbitantes que davam até para controlar os espectadores que estão na meta de todas as etapas de todas as corridas.

E sabem o que aconteceu na Volta ao Algarve?
Exactamente!...
Mas, se foi a primeira - esta temporada - não será, de certeza a única.
Para onde vai o dinheiro?

Por acaso... é uma boa questão.
Para onde irá o dinheiro?

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