quinta-feira, janeiro 17, 2008

1037.ª etapa

FALECEU OCEANA ZARCO,
A MENINA CICLISTA DE SETÚBAL


Caíu-me hoje na Caixa de Correio mais uma notícia triste e que volta a cobrir de luto a Família Ciclista. Faleceu - já na passada sexta-feira mas, aparentemente ninguém deu por isso - a pioneira do Ciclismo Feminino em Portugal, Oceana Zarco. Ninguém, não. O Setubalense, jornal da cidade do Sado deu a notícia. Que só hoje me chegou.

Curvo-me ante a sua memória e, com a devida vénia, atrevo-me a transcrever aqui a notícia assinada pelo colega António Elias.

Oceana Zarco tinha quinze anos quando venceu, no Outono de 1926, a III Volta a Lisboa em bicicleta, pedalando ao lado de rapazes e homens por estradas agrestes e calçadas. Foi pioneira do ciclismo feminino em Portugal, ousando afrontar usos e costumes, não só portugueses, que remetiam as raparigas para os lavores ou para desportos mais gentis.

Com a camisola do Vitória, Oceana Zarco, enfrentou o pó dos caminhos e despertou o aplauso das gentes. Faleceu na última sexta-feira, em Setúbal, aos 96 anos de idade, com a sua imagem já gravada na história do Desporto.

A menina que, corria o Outono de 1926, com mimosos quinze anos, venceu, na sua categoria, a III Volta a Lisboa em ciclismo e a I Volta ao Porto, vindo três anos depois a conquistar a Volta de Setúbal, repousa desde o passado sábado no cemitério de Nossa Senhora da Piedade, em Setúbal, cumpridos que foram 96 anos de uma vida que, pelo Desporto e pelo exemplo de mulher, já estava gravada na memória das gerações presentes e não deixará de ser lembrada pelas vindouras.

A ciclista do Vitória Futebol Clube foi pioneira em Portugal – ousamos até dizer que na década de 20 terá integrado, universalmente, como atleta de competição, uma élite muito reduzida de raparigas que se dedicava a uma modalidade que ainda hoje é maioritariamente masculina – a enfrentar os caminhos de então, pedalando ao lado de rapazes e homens, arrebatando prémios e granjeando a admiração e o carinho das pessoas que, na época, tinham o ciclismo como uma modalidade verdadeiramente sua, por radicalmente popular.

Em 1991, no Dia Internacional da Mulher, o Movimento Democrático de Mulheres e o Museu de Arqueologia e Etnografia de Setúbal editaram em homenagem de Oceana Zarco em que se pode ler: «… O seu mérito, os vários prémios que alcançou, a medalha de ouro que conquistou, dignificaram sem dúvida o ciclismo português, dignificaram também a mulher portuguesa. Abriram-se caminhos para novas esperanças, novos sonhos, novos projectos. O ciclismo feminino foi um sonho de Oceana, é ainda um sonho das ciclistas portuguesas neste fim de século».

O século em causa (XX) já virou e corre já o oitavo ano de um novo, mas as palavras que acabamos de lembrar mantêm-se sem margem para dúvida como uma boa síntese da pedrada no charco que representou há cerca de oitenta anos a ousadia da rapariga que quis ir mais longe, viver mais intensamente, do que aquilo que lhe estava destinado pelos padrões da sociedade de então.

Ao grito de rebeldia que foi o ciclismo, Oceana Zarco, viria noutra altura da sua via a aliar um sentimento altruísta ao enveredar por uma profissão, a de enfermeira no hospital da Misericórdia, em Setúbal, marcada pela entrega ao sofrimento alheio.

Viveu a última década, um pouco mais, no Centro de Apoio a Idosos da Santa Casa da Misericórdia e faleceu, cremos que tranquilamente, na passada sexta-feira.

Fica a memória, que muito dificilmente se vai esfumar, da menina que «nos anos 20 pedalava aos lado dos seus companheiros homens e com eles travava o duro combate das subidas, das calçadas difíceis», como diz o texto a que atrás recorremos.

( Podem ver a notícia original AQUI)

Para quem não sabe quem foi Oceana Zarco vejam aqui...

http://www.youtube.com/watch?v=bIISJxIKzZE

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