sexta-feira, março 02, 2007

436.ª etapa


VOLTA AO ALGARVE: UM PERFEITO CARTAZ PROMOCIONAL DA REGIÃO

Cumpriu-se, a semana passada, a primeira corrida por etapas do Calendário Nacional que, como vem a acontecer desde há uns anos a esta parte, é uma prova do Calendário Europeu da UCI e que, uma vez mais, trouxe até nós um pelotão de luxo.

Não é, agora, a altura para discutir se foi ou não exagerado o número de equipas presentes – um recorde que só encontra paralelo nas maiores provas por etapas do Calendário Mundial.
Primeira ressalva. Antes de se procurarem os pontos mais fracos para “atacar” a Organização dever-se-ia ter isto em conta: estiveram 24 equipas na Volta ao Algarve e a associação de ciclismo local teve de recusar, pelo menos, mais dez pedidos. Alguns de equipas ProTour.

Estou à vontade porque já aqui o escrevi – não vogo ao sabor do vento e não tenho preferências concretas em relação a nenhuma prova – contudo, reitero a opinião de que sendo indispensável (eu acho que sim) ter Portugal uma corrida no Calendário de Topo, seja, como venho a escrever, o ProTour, uma reedição da antiga I Divisão num espectro mais aberto no que se refere ao acantonamento das equipas, seja lá no que fôr, é muito importante para Portugal, e para o ciclismo português, termos uma prova inscrita nesse tal Calendário de Topo. E a Volta ao Algarve, por todas as razões, é a que me parece mais próxima das exigências impostas.

É uma corrida que se disputa logo no início de temporada, uma corrida onde a maioria das equipas vem apenas para somar quilómetros mas, ao mesmo tempo, uma corrida que pode ter no seu pelotão algumas das principais equipas com alguns dos seus principais nomes. Que não deixarão de querer defender a “honra”, fazendo o possível para ganhar.

E, embora, apelando ao espírito nacionalista, também eu gostasse que fosse um corredor português a ganhar, não posso deixar de reconhecer que, em termos de mediatismo, a nível internacional, a Volta ao Algarve tem outro impacto só pelo facto de o vencedor ter sido… o Alessandro Petacchi.

Mas recuando na apreciação da corrida, as características físicas da região mais a Sul de Portugal são perfeitas. Neste tipo de traçado escolhido que este ano foi quase perfeito. E escrevo quase porque não acredito na perfeição pura.

Ouve etapas longas, mesmo a calhar para os classicómanos; havia montanha, sem ser demasiado exigente, que serviu para testar forças… e, como desde o início se percebeu, a hipótese – confirmada – de cinco chegadas ao sprint.

Não vê quem não quer. O traçado foi perfeito para uma das primeiras corridas por etapas – foi a segunda, atrás da Volta à Andaluzia (razão porque não houve equipas espanholas…) – da temporada. Depois, o clima do Algarve, nesta altura do ano, oferece condições a raiar o perfeito. Não está frio, normalmente o sol brilha mas, e como aconteceu este ano, na 2.ª etapa até choveu durante metade da tirada. É óptimo. Estas serão as condições que o pelotão internacional vai encontrar na Europa Central… em Maio.

Por isso todos os responsáveis por todas as equipas do ProTour se manifestaram agradavelmente impressionados com a corrida.

Ah!... nem mesmo aqueles que terão criticado “as estradas más” se queixaram. Pura e simplesmente porque as não houve. Terá sido um mal entendido, terá sido um olhar, de alguma forma vindo de cima, em relação a um país que não está tão cotado quanto isso em termos internacionais, a levarem as tais figuras a dizer que “receavam as estradas estreitas e mal asfaltadas…”

Isso não existe, a corrida foi disputada sempre por estradas mais do que razoáveis e, àparte uma ou duas chegadas mais complicadas – dificuldades potencializadas pela nossa febre de construir uma rotunda em qualquer sítio, desde que haja espaço físico para isso, do que por outra coisa.

Estive no Algarve dois dias. No da chegada a Loulé, no sábado, uma chegada nada fácil, com a meta instalada em meia avenida – em termos de largura – ainda por cima com um separador central, que não deixava mais do que quatro metros de asfalto de barreira a barreira, e não houve problemas. No Domingo, na chegada a Portimão, os mesmos “velhos do Restelo” de sempre previam grandes complicações na chegada por causa de uma curva, a 2 km da chegada, que rondava os 60º e depois uma sucessão de curvas até à recta da meta, voltou a não confirmar-se. Por acaso voltou a haver uma queda, mas numa zona muito antes da meta que nem esses “especialistas” lograram antever.

Aos críticos portugueses – jornalistas, pois então – falta-lhe experiência em termos internacionais. Eu já vi dezenas de chegadas piores do que estas duas, lá fora, em Espanha, por exemplo. Mas, quem tem uma folha de jornal em branco à sua frente, e pouco para escrever, sempre aproveita para se dedicar a exercícios mais ou menos académicos, onde – sem, na verdade, terem habilitações para isso – peroram sobre questões de segurança.

Depois não saiu nada nos jornais porque, quando confrontados com as perguntas direccionadas, os homens que verdadeiramente sabem quais as condições em que têm de pedalar no seu dia-a-dia, esvaziaram a questão. Estão habituados a chegadas deste tipo.
Não houve uma chegada nesta Volta ao Algarve que tenha sido ostensivamente “anti” corredor. E se eles não se queixaram… foi porque já passaram por pior.

É um facto que, ouvindo algumas opiniões, registei algum desagrado em relação à chegada a Tavira. Mas isto só acontece porque é a Volta ao Algarve e tem cá “locomotivas” como as da Milram.

O adepto mais informado sabe como estas coisas funcionam. A Milram – se calhar por ter Petacchi – é neste momento o grande (senão o único) “comboio” que imprime, a partir dos últimos dez quilómetros para a meta aquela velocidade infernal que impede, seja quem for, de por pé em ramo verde. Esta equipa não faz outra coisa. Controla as etapas até ao limite máximo possível, por essa altura anula seja que fuga for e naqueles últimos dez quilómetros “arrasta” o pelotão a 65/70 km/hora até à recta da meta. E em Tavira a recta da meta é antecedida, não por uma rotunda, mas por uma composição de triângulos derivadores de direcções que desebocam numa rotunda. A largura útil do asfalto utilizável chega ao metro e meio e aí… aí é fácil acontecerem quedas.

Depois, também aconteceram quedas, por exemplo, na chegada a Portimão. Não tenho aqui hipóteses de explicar devidamente os pormenores, mas a corrida entra na cidade do Arade por uma ampla via dupla que, na altura em que é necessário mudar de direcção, afunila numa via de faixa única. Estava-se ainda a 4 mil metros da chegada e aconteceram quedas… e lá sou eu, outra vez, obrigado a referir-me às minhas experiências no estrangeiro. Em Espanha que, como estou cansado de dizer, é a realidade que melhor conheço.

As cidades espanholas cresceram harmoniosamente, envolvendo o chamado núcleo histórico com constrições modernas e… vias de acesso modernas. Em Portugal, a modernização faz-se deitando abaixo as casas dos núcleos históricos e levantando… no mesmo sítio, novos prédios. As cidades portuguesas não souberam crescer respeitando o seu núcleo histórico. Descaracterizaram-no. Mas, e eu aceito e aplaudo a ideia, a organização da Volta ao Algarve – porque a promoção turística da região é ainda uma das principais molas do evento –, exige que as chegadas aconteçam nesses núcleos históricos.

Mas isto já é uma outra discussão. A verdade é que, Tavira à parte – onde, por acaso, a etapa terminou já numa zona “nova” da cidade, em todas as outras se chegou aos núcleos históricos e… sem problemas de maior.

E, repito, nem aqueles dois directores desportivos de duas das equipas estrangeiras que cá estiveram, desta vez tiveram a “urgência” de procurar os jornalistas portugueses para se queixarem. Nem das estradas… nem das chegadas.

Tentando resumir… Não houve problemas com o super-pelotão de quase 200 corredores, nem nas alegadas estradas estreitas por onde a corrida passou, nem nas chegadas, mesmo nas mais complicadas.

Ganhou o Algarve, ganhou a Organização – que já tem garantidas as presenças das principais equipas que cá estiveram este ano, com os mesmos nomes que agora trouxeram – e ganhou o ciclismo português. Que é a correr com os melhores que podem aprender – aprender sim! que me não venham dizer que não aprendem – e, no futuro tirar disso dividendos.

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