quarta-feira, maio 17, 2006

84.ª etapa



MAS PROTESTAM CONTRA O QUÊ?

Continuam a subsistir grandes dúvidas quanto ao acordo assinado entre a União Ciclista Internacional (UCI) e a Associação Internacional de Jornalistas de Ciclismo (AIJC) – cuja existência há até quem ponha em causa (ver www.aijc.info) – e que visa tão somente entregar a jornalistas especializados em Ciclismo a cobertura das principais provas do Calendário Internacional, as do ProTour e as HC dos Calendários Continentais. O objectivo não é, nunca foi, outro do que assegurar a quem gosta de ciclismo uma informação avalizada. Que os leitores dos Jornais leiam Crónicas, Opiniões e Entrevistas feitas por quem, legitimamente, está profissionalmente preparado para tal; quem ouve Rádio escute entrevistas objectivas, para o que o jornalista terá de ter os conhecimentos necessários para as fazer e não apenas colar o microfone, recolhendo sons e opiniões que ele não faria, porque para tal não tem conhecimentos. Na TV isto não acontece, pelo que passamos à frente.
Ora, até agora, a palavra que mais vezes escrevi foi: Jornalista.
Para quem não sabe o que é ser jornalista, aqui fica:

: Estatuto do Jornalista(Lei n.º 1/99 de 13 de Janeiro)
A Assembleia da República decreta, nos termos da alínea c) do artigo 161.º da Constituição, para valer como lei geral da República, o seguinte:
:: CAPÍTULO I
:: Dos jornalistas
:: Artigo 1.º
:: Definição de jornalista
1 - São considerados jornalistas aqueles que, como ocupação principal, permanente e remunerada, exercem funções de pesquisa, recolha, selecção e tratamento de factos, notícias ou opiniões, através de texto, imagem ou som, destinados a divulgação informativa pela imprensa, por agência noticiosa, pela rádio, pela televisão ou por outra forma de difusão electrónica.

Tenho a certeza (não, não vou repetir o exemplo caricaturado que já usei várias vezes), que qualquer profissional em qualquer outra área compreende e aceita um regime em tudo idêntico para a sua profissão.

Nenhum advogado pode sentar-se no cadeirão do Juíz; nenhum enfermeiro passa receitas; nenhum agente da PSP comanda o Posto; nenhum soldado raso comanda uma Companhia; ninguém sem carta de condução pode (legalmente) conduzir; nenhum assistente de bordo pode pilotar um avião; o Chefe-da-Casa-Civíl do Presidente da República não promulga leis; nenhum cliente, por muito que saiba de culinária, chega a um restaurante e vai ocupar o lugar do Chefe de cozinha... nenhum contínuo no meu jornal escreve notícias.


Tenho a certeza que toda a gente nem pestaneja, quanto mais por em causa estes casos. Em relação aos Jornalistas... venho a observar reacções do género “deus nos acuda!”. Mas porquê? Será menos nobre a nossa profissão? Será isso?

É que todos os argumentos “passam por cima” da definição de Jornalista, ignorando-a (em muitos casos, porque são pessoas até com formação académica) esse ignorar vem eivado de má-fé.

Esta discussão, para ser séria, terá sempre que começar pela definição de jornalista.

Depois, há o caso da Carteira Profissional. Os vários títulos disponíveis, só por existirem e estarem regulamentados e sustentados na Lei, apenas têm uma leitura: há diferenças. Porque se as não houvesse, só existia um título de jornalista. Se há meia-dúzia é porque não se podem comparar, ou melhor, podem. Comparem-se e vejam-se as diferenças.

Um director-desportivo só o pode ser se tiver um curso, e dentro deste há vários níveis e nem todos dão para se treinar uma equipa de topo. Ninguém reclama.

Depois, e creio que é uma outra parte que tem vindo a ser desonestamente ignorada, a AIJC não é um “clube elitista e fechado”. Quem tiver habilitações profissionais para ser membro, basta-lhe pedir a sua admissão. É evidente que, se não ficar demonstrado que tem, efectivamente, conhecimentos e experiência ganhos na estrada, não serão aceites.

Já uma vez o disse, os 4 jornalistas portugueses inscritos na AIJC – um deles até está radicado em Paris e é “apenas” colaborador do Jornal a BOLA* e não faz serviços em Portugal – estávamos dependentes da delegação espanhola porque não éramos suficientes para ter uma delegação em Portugal. Entretanto, vários colegas houve que, em vez de ficarem a reclamar em “forúns”, nos procuraram para saber o que fazer para se filiarem e os seus processos estão em apreciação, não tendo eu, nem o entretanto – porque vai crescer o número de sócios em Portugal – designado Delegado para Portugal, quaisquer dúvidas de que serão aceites a horas de, quando a Volta a Portugal sair para a estrada já estarem munidos do respectivo cartão.

Então... que dúvidas persistem? Que dúvidas podem persistir? Só vindas de pessoas menos bem intencionadas.

O ciclismo vive do público que acorre à estrada e é de todo legítimo que o público queira guardar uma recordação da sua ida até à corrida. Nada, repito: nada há que impeça ninguém de, antes das etapas começarem se aproximarem do local onde as equipas se concentram e tirar fotografias aos seus ídolos. Mesmo após a chegada, e uma vez que os carros das equipas estacionam algumas dezenas de metros para além do local da meta, nada impede, uma vez mais, o público de acercar-se e qualquer pessoa pedir ao seu ídolo que fique numa foto ao lado do seu rebento.

Nada impede qualquer espectador de, perto da chegada, tirar uma foto aos corredores a aproximarem-se ou a cortar a meta. Não o podem fazer, e creio que isto é tão simples que não entendo a insistência, é na zona interior das barreiras de segurança onde só os profissionais têm lugar.

No que atrás ficou escrito, onde é que sobram motivos para dúvidas?

Vê-se, perfeitamente, nos jogos de futebol – e não só – principalmente se forem à noite, os milhares de flashes a dispararem. É o público que, do seu lugar, quer registar a sua presença naquele evento. Por que cabeça passará, não sendo fotojornalista, que qualquer um pode descer ao relvado e fazer fotos junto à baliza, ou junto aos jogadores que erguem a taça?

O português, embora seja exageradamente complacente na sua condição de cidadão, na qual todos os dias é “maltratado” nada fazendo para fazer vingar os seus direitos, a não ser quando se afasta e vai falando alto para todos ouvirem, mas já de costas voltadas e a abandonar o local sem olhar para trás, não gosta de regras. Ao meu vizinho já lhe chamei a atenção “ene” vezes para não deitar garrafas vazias no contentor do lixo, até porque na rua temos um “vidrão” afastado daquele 20 metros. Um dia respondeu-me: “Não estou para fazer tudo o que ‘eles’ me mandam fazer.” Claro que se um dia for com as garrafinhas e na rua estiver algum elemento da autoridade ele vai por as garrafas no “vidrão”. É a sua forma – pouco honesta, aliás – de se considerar um homem livre. Faz o que muito bem lhe apetece. Não faz nada. Está apenas a enganar-se e a ser mau cidadão.

Este exemplo não cai aqui de “pára-quedas”. Tem a ver com o facto de o português, “manso” por natureza, esperneia e bufa contra todas as regras que lhe são sugeridas ou impostas. Estas aceita-as, não tem remédio, mas sai do local a falar alto para todos ouvirem, sem voltar as costas e apressando-se a sair dali. É cobarde.

O que está a acontecer em relação ao acordo entre a UCI e a AIJC é uma regra.

Perceberam a parábola lá atrás?

Imaginem o homem do talho do vosso bairro vestir uma bata e apresentar-se num bloco operatório de um qualquer hospital. Só porque sabe “cortar”.

* - Que fique registado que o colaborador de A BOLA, radicado em Paris e que é membro da AIJC é "só" o Bruno Santos, que há dois anos atrás recebeu das mãos do próprio Jean-Marie Leblanc uma placa alusiva ao facto de estar a cobrir o seu 40.º Tour. É obra!

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