terça-feira, maio 30, 2006

99.ª etapa



FAZER DE CONTA QUE NÃO SE PASSOU NADA




Em relação a “escaldões” [ver dois artigos atrás] confesso que, para já, me sinto um pouco defraudado com a evolução da Operação “Puerto”, em Espanha. Nos países mais liberais, a compra de estupefacientes para consumo próprio não é crime. À luz do Direito espanhol – como no da maioria dos países – o “doping” não é droga, os Códigos Civis não prevêem penas para o seu uso e somente os regulamentos das federações, confederações e comités olímpicos, adoptando as regras da Associação Mundial Antidopagem (AMA) podem, desportivamente, punir os batoteiros. Se bem que haja casos que depois são passíveis de cair sob a alçada da Lei geral.

Sem o estardalhaço das prisões sob os holofotes da Comunicação Social – como aconteceu com o nosso nado-morto
“Apito Dourado” – a Guardia Civil apanhou em flagrante, apesar de para isso se ter valido de escutas telefónicas e gravações de vídeo, meia dúzia de figuras (das gradas, quase todas) do ciclismo espanhol. O processo está sob segredo de justiça, daí nos últimos dias não ter havido quaisquer desenvolvimentos, o que não significa que não se continue a trabalhar na busca da verdade total e de forma a castigarem-se os prevaricadores, mas a sensação é a de que... o pior já passou. A “Interviu”, uma revista espanhola, misto de “Nova Gente” e “Tal&Qual” adiantou alguns nomes de ciclistas envolvidos. Ciclistas que, no seio da rede, são identificados por “pseudónimos”. Fala num “Búfalo” que, segundo a mesma revista, será Quique Gutierrez (um dos corredores que mais surpreendeu no Giro, agora findo) e que “o Búfalo precisa de alimento”, o que proporciona variadíssimas leituras.

Não ajuda em nada, salvo no recrudescer das suspeitas. E, na verdade, enquanto não se souberem os nomes dos REALMENTE implicados... TODOS são envolvidos nas mesmas águas turvas. Quem sai a perder é o ciclismo.

Entretanto, a mais controversa figura do ciclismo espanhol – e não só – dos últimos anos, Manolo Sáiz, é apanhado em flagrante, foi tornado público que entrou num café de mãos vazias e que, depois de a ele se ter juntado o médico (?) Eufiminiano Fuentes, que levava uma pasta consigo, saiu com a mesma pasta onde foram encontrados produtos dopantes, para além de uma anormalíssima verba, em euros e francos suíços, montante que nenhum cidadão vulgar leva no bolso para ir tomar um café... Sáiz foi obrigado a dormir uma noite nas instalações do departamento de investigações da Guardia Civil mas saiu menos de 24 horas depois. Não pode ser detido porque... tratar-se-ia
“apenas um comprador” e não um elemento da rede ligada ao doping e/ou equiparado.

Numa decisão que era de esperar, o patrocinador principal da equipa de Sáiz retirou-lhe o apoio. O segundo patrocinador chegou a anunciar que faria o mesmo mas Sáiz, qual
“sempre-em-pé” já hoje anunciou que garantiu novos apoios para levar a equipa, pelo menos até ao final da temporada.

Tentar salvar a equipa, e os corredores e demais
“staff” parece-me totalmente aceitável, até do ponto de vista humano, mas permitir que seja Sáiz a manter-se à frente dos seus destinos é a prova provada que a “rede” se calhar se estende e espraia bem para além dos Eufiminianos Fuentes e Manolos Sáiz do ciclismo.

Alguém ouviu ou leu alguma reacção das cúpulas da UCI em relação a este caso?



(Um grande amigo meu, em conversa que mantivemos em tom informal, garantiu-me que a equipa estava acabada porque sem patrocinador e com a Liberty Seguros a impedir a utilização do seu nome e das suas cores, pelos regulamentos, e porque, de facto, estes dizem que os equipamentos têm de ser aprovados pela UCI antes da aceitação da inscrição das equipas, não seria possível voltarem a correr. Entretanto, veio a lume o caso Team Coast e, a verdade é que, a meio da temporada não só mudou de nome como de equipamentos, logo... E já li hoje que a equipa vai correr com equipamentos novos, com as cores do segundo patrocinador – que será, por agora, o principal - a Bicicleta Basca e que, para o Dauphiné Libéré já apresentará outros, estes com o novo patrocinador. Uma petrolífera kazaque que entra para o ciclismo depois de contactos efectuados por Alexandre Vinokourov junto do próprio Primeiro Ministro kazaque que é também... presidente da federação de ciclismo daquele país.)

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