[Acordo Ortográfico] # SOU FRONTALMENTE CONTRA! (como dizia uma das mais emblemáticas actrizes portuguesas, já com 73 anos, "quem não sabe escrever Português... aprenda!») PORTUGUÊS DE PORTUGAL! NÃO ESCREVEREI, NUNCA, NUNCA, DE OUTRA FORMA!
terça-feira, junho 27, 2006
126.ª etapa
PÁREM DE FALAR EM «DOPING»
Nas últimas semanas todos nós, os que adoptámos o Ciclismo como a nossa modalidade preferida, vimos a reagir de uma forma, digamos, muito pouco lúcida, em relação às notícias que, em catadupa, nos chegam das mais diferentes proveniências.
E, ao contrário dos pais que, por norma, e muito por instinto também, se apressam a defender os filhos, acolhendo-os no abrigo dos seus braços, o que é que tenho observado? À mais simplista – no sentido de desresponsabilização individual (nem que seja apenas o reflexo de um acto puramente pavloviano) - das formas de encarar os factos. Estamos perante um escândalo, disso não restam dúvidas, mas tratar o que está a acontecer como um simples caso de doping, ou casos de doping, porque a Operação Puerto, e é disso que estou a falar, envolve, disso já estamos seguros, um número elevado de corredores e outras pessoas que gravitam à volta do ciclismo, isso tem de parar porque não faz sentido.
É o primeiro erro.
Não se está a trabalhar num, colectivizemos então, não se estão a tratar de casos de doping e as primeiras notícias, se lidas com a atenção merecida, até nem deixaram de ser claras.
À luz das legislações – e elas são todas muito parecidas – da maioria dos países europeus, e demais, do chamado primeiro mundo, o acto de se recorrer a substâncias que eventualmente possam melhorar prestações desportivas não está enquadrado em nenhuma Lei. As autoridades não podem investigar, perseguir, muito menos deter quem, eventualmente, recorra a estes métodos.
Depois há, algumas delas reconhecidas internacionalmente e com um peso específico bastante relevante, outras entidades que, essas sim, podem sancionar o uso de produtos – que elas mesmas indexaram – ou punir práticas que, segundo a mesma “tábua” de regras, sejam passíveis de cair sob da sua alçada.
Falo da AMA (Associação Mundial Anti-dopagem) ou dos diversos departamentos nacionais (referindo-me a cada uma das nações) cuja missão é, exactamente, a luta contra a “batota” no desporto. De uma maneira geral.
É alguma destas autoridades que, em Espanha, está neste momento a actuar? Não! Porque não têm por onde pegar. Na verdade, um atleta só cai sob a sua alçada SE for apanhado num dos controlos que todas elas fazem regularmente.
O que está a acontecer em Espanha (e já aconteceu em França, em 1998, e em Itália) é que são, de facto, as autoridades policiais, devidamente escudadas pelas autoridades judiciais, que desenvolvem uma operação – isto nunca foi focado, porque se presume, à partida, que a maioria das pessoas o sabem – que visa, espantem-se agora, presumíveis atentados contra… a saúde pública. Sendo que qualquer atleta, seja de que modalidade for, é, antes disso, um cidadão.
Estamos, e não vi isso escrito em lado nenhum, perante uma operação que pretende desmantelar uma presumível rede que, de modo contínuo ou não, à luz das Leis gerais de qualquer estado, se entrega a práticas que, no seu acto mais simples, pode atentar contra a saúde pública.
Aqui, onde as autoridades desportivas não podem chegar, é campo onde podem e devem movimentar-se as autoridades policiais e judiciais de qualquer país.
Fazer transfusões de sangue, seja ele exógeno ou endógeno, passou a ser proibido pelas autoridades desportivas, mas estas só podem actuar quando conseguem provar que alguém o fez. Retirar sangue a uma pessoa, manuseá-lo e voltar a introduzi-lo numa pessoa, se se tratar de um acto reconhecidamente e apenas clínico, é aceite pela comunidade médica e não foge um milimetro a seja que Lei for.
Agora, tirar sangue, manuseá-lo e armazená-lo em locais que não hospitais ou outros estabelecimentos reconhecidos como tendo essa vocação; fazer transfusões – ou mesmo apenas retirar sangue – num quarto de um hotel, armazená-lo e vendê-lo à embalagem, isso, fugindo às regulamentações desportivas cai, sem apelo nem agravo, sob a alçada das autoridades sanitárias que podem, e fizeram-no, pedir às polícias que, sob o mandado de um juiz, interfiram. Identifiquem e punam os prevaricadores.
Resume-se a isto a Operação Puerto. De certeza que, judicialmente, nenhum corredor pode vir a ser punido. Por isso as atenções das polícias se viram para quem, mesmo sendo médico, assiste a estas transfusões – ilícitas, porque não observam as regras gerais de saúde pública – e sobre quem, seja sob que pretexto for… as negoceia. Sendo vendendo ou comprando.
Falar de doping neste caso, neste, em particular, é de um despudorado desconhecimento das coisas.
Agora… Se quem compra esse sangue é um elemento de uma equipa desportiva – seja de ciclismo ou não -, é evidente que mete em alerta as autoridades que tentam zelar pela verdade desportiva. E o que podem fazer? Nada.
Nada a não ser que, mesmo que isso possa significar “esticar” um pouco a sua investigação, levando-a além daquilo a que seria, para o seu propósito, suficiente, as autoridades policiais façam o que se fez em Itália ainda não há muitos anos e, revistando os hotéis onde estão instaladas equipas, venham a encontrar provas de que – neste caso – o tal sangue comprado foi mesmo utilizado.
Eu não tenho formação jurídica, mas o pouco que sei dá para adiantar o seguinte:
Em Itália, quando a polícia revistou os hotéis das equipas – e para isso é preciso um mandado judicial – isso só poderia ter sido feito sob a justificação de se juntarem provas de forma a chegar-se a… uma eventual rede que atentava, repito, segundo a Lei geral, contra a saúde pública.
Não sei o que os franceses poderão fazer na próxima semana, ou já no final desta… mas em Espanha as polícias dificilmente conseguirão o acordo de um juiz para vasculharem no seio das equipas porque inverteram a operação apontando logo para a “cabeça” do “polvo”. E se conseguirem ligar os “pseudónimos” anotados nos documentos que apreenderam a ciclistas em concreto, apenas os podem expor à opinião pública.
As autoridades policiais não podem arrestar ninguém por ser apanhada a fazer uma transfusão e as autoridades desportivas, se os não apanharem em flagrante, ou através de resultados positivos em qualquer uma análise, mesmo que saibam os seus nomes nada podem fazer.
Portanto, condensando, o que aconteceu em Espanha foi uma operação em defesa da saúde pública. Nada teve a ver com as autoridades desportivas e estas ficaram na mesma. Bem podem os jornais publicar até o nome completo, o número do BI e o n.º de Contribuinte dos corredores que quiserem.
Desportivamente, se não forem apanhados nos controlos das entidades da luta anti-doping… vai acontecer: NADA!
Porque é que, então, a Organização do Tour tomou a atitude que tomou em relação à Astaná-Wurth? Ora bem, porque as empresas proprietárias das licenças desportivas das equipas ProTour assinaram uma certa Carta Ética!... E Manolo Sáiz, provavelmente um dos seus redactores, deixou-se apanhar…
Em relação à Comunitat Valenciana… ninguém, a não ser que algum atleta seja apanhado – e nesse caso SÓ esse atleta será castigado -, pode mexer-lhe nem com um dedo.
Diz-se que à mulher de César se lhe pedia que, mais do que ser séria deveria parecê-lo. Foi o que as empresas detentoras das licenças ProTour fizeram. Para “parecerem” sérias assinaram uma Carta de Ética… e foi a pontinha solta por onde a Organização do Tour pode pegar. E tem toda a razão do seu lado, não acredito que abra mão de não querer a equipa espanhola no seu pelotão. Até porque a “guerra” entre as 3 Grandes e a UCI e o ProTour apenas vive uma trégua. Não acabou.
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2 comentários:
MZMadeira, não podia estar mais em desacordo consigo:
«Falar de doping neste caso, neste, em particular, é de um despudorado desconhecimento das coisas»
Dizer que este caso nada tem a ver com doping é tapar o sol com uma peneira. Uma coisa são os termos técnicos da lei, outra é a interpretação que é lícito dar-lhe. E a "Operação Porto", quer queiramos quer não, é uma investida da Justiça contra práticas ilegais, entre as quais as transfusões sanguíneas e a prescrição de substâncias químicas, algumas delas ilegais em Espanha, e todas elas consideradas como doping. Mesmo pegando apenas na parte relativa às transfusões sanguíneas, é um preciosismo legal e linguístico não as classificar como doping. Aliás, de acordo com a Agência Mundial Antidopagem por doping entende-se tudo o que viola as regras antidoping e as transfusões violam-nas.
Ao contrário do MZMadeira, não me parece relevante saber se a lei desportiva e civil tem por onde pegar e como castigar os ciclistas que forem apanhados na operação. A mim interessa-me é que se desmonte esta rede de dopagem e que se divulgue o nome de todos os implicados, desde os mais culpados, onde se encontram os médicos e os directores desportivos, até aos ciclistas, que nuns casos serão vítimas, mas que noutros sabiam muito bem o que queriam. Ou seja, para mim valerá tanto a censura pública como uma condenação judicial. Explicando melhor: caso seja provado que Jan Ullrich (é só um exemplo) usou realmente dos esquemas fraudulentos alegadamente montados, chega-me essa prova e a respectiva condenação pela opinião pública.
É óbvio que uma eventual suspensão desportiva seria o mais justo, mas pode nem ser preciso. O caso em investigação em Espanha tem tal amplitude que, por uma questão de imagem, não duvido que, de futuro, haverá um boicote aos envolvidos. E que mesmo os corredores que não podendo ser castigados pela justiça civil e desportiva acabem por pagar com o desemprego aquilo em que se meteram e/ou em que foram metidos.
Ok, José Carlos
até sou capaz de concordar contigo. Na verdade e na sua essência, estamos a falar de produtos e métodos proíbidos mas onde eu pretendia chegar era mesmo ao facto de, disto tudo dificilmente poder vir a sair alguma penalização desportiva.
Fala-se em doping e pensa-se em alguém apanhado num controlo. Aí, sim, será castigado desportivamente.
Tenho lido o que encontro na imprensa espanhola e a leitura que disso extraio é aquela que expus.
Veio-me à memória um filme que já vira há alguns anos e que revi este fim de semana na TV. Mississipi em Chamas, não sei se viste. Quando o FBI chegou à conclusão de que era impossível prender aquele bando do KKK por homicidio, crime estadual e não federal, apanharam-nos por atentado contra os Direitos Humanos.
Mal comparado, é o que a Guardia Civil fez. Sem jurisdição no campo desportivo, lançou a rede e apanhou aquela meia dúzia de figuras enquadrando o ilícito no atentado contra a Saúde Pública. Fui levado por aí.
No resto tens toda a razão, mas se já se podem identificar alguns nomes de ciclistas, a verdade é que contra eles, se não forem apanhados num controlo nada poderá ser feito.
E todos sabemos o quanto este aspecto é cuidado. Com a excepção da equipa do Manolo Sáiz que o ano passado conseguiu ver dois homens afastados da corrida - ainda assim, sem que se possa dizer que estavam dopados - e depois o Heras, esse sem hipóteses de fuga. Mas por esta altura já devem ter calibrado a maquinazinha de medir o hematócrito.
Já agora, permite-me acrescentar uma coisa.
(Tantas vezes eu fui mal interpretado quando tentei esclarecer um ou outro ponto e o mínimo que me chamaram foi... ter a mania de ser "sabichão")
Em espanhol, "puerto" tem dois significados (pelo menos): o de porto, no sentido de porto de mar, de pesca... no léxico do ciclismo "puerto" significa montanha. Creio que será este o verdadeiro código da operação, mas como em português Operação Montanha não faz muito sentido, se calhar devemos manter a palavra espanhola, evitando traduzi-la para "porto". Já reparaste que Operação Porto fica um pouco "deslocada" neste caso?
Um abraço... e desculpa lá esta parte final.
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