quinta-feira, agosto 17, 2006

209.ª etapa



SEGURANÇAS(?)


Sou do tempo em que ainda não era preciso haver "seguranças" na Volta. Havia, isso é verdade, uma meia dúzia de figuras contratadas - pelo menos pelo seu aspecto - no cais da estiva do porto de Leixões, de volumosa barriga fora da camisola suja e transpirada que, mais pelo aspecto e pelo cheiro do que por outra coisa, afastavam as pessoas das "portas" de entrada na zona de chegada. Até essa porta, a uma boa centena de metros da meta, corríamos - não me excluo porque também fiz isso - então atrás dos corredores para, sem lhes dar tempo sequer a respirar querermos à viva força uma declaração que, naquelas circunstâncias, nunca passava do "foi duro e difícil mas estou contente..."

Já no fim da era JN a segurança chegou a ser feita por um grupo de pára-quedistas. Era mais funcional. Os portugueses sempre respeitaram (e temeram) as fardas.

Agora as coisas são diferentes, mas contratar uma empresa de segurança até nem é original. A primeira vez que isso aconteceu, ainda no tempo do JN - creio até que seria a mesma empresa que fez a segurança este ano, pelo menos, tanto quanto me lembro, os uniformes eram semelhantes - e no primeiro ano, quem comandava a equipa na Volta era o pai do corredor Paulo Ferreira.

Só estive uma tarde na Volta. Foi em Lisboa. Apesar de ser o jornalista da escrita, em actividade, com mais voltas feitas, de nos últimos 16 anos ter coberto mais de uma centena de corridas e de toda a gente me conhecer, quando cheguei ao recinto da chegada, e apesar de levar colocada uma "pulseira" azul a dizer VOLTA-LISBOA-6 DE AGOSTO, ainda foi preciso o Fernando Petronilho, responsável pela montagem e organização das Salas de Imprensa e pelas informações oficiais da corrida, para os jornalistas, dizer ao senhor da "porta" que «é um convidado, tem acesso aonde quiser ir...»
Dali passei!

Mais à frente, junto ao camião de onde trabalham as rádios, já não me foi permitida a passagem. O Joaquim Vieira, o Alex, o João Carlos Garcia tiveram de vir cá fora e debruçar-se no varandim para me abraçarem. Para eu os abraçar. A minha última intenção seria a de prejudicar os colegas que estavam a trabalhar, mas...

Depois, tive, de facto, acesso à zona VIP onde pude estar com alguns dos muitos amigos que tenho no ciclismo, e foi aí que vi a etapa, num dos vários monitores de televisão. Até tive direito a uma garrafa de água, mas podia ter pedido qualquer outra coisa, que era à borla. Mas eu agora estou a água.

Mais tarde, já depois da etapa terminada, o Fernando Petronilho combinou comigo - tinha ido com ele e regressaria com ele à Sala de Imprensa, que ainda ficava longe - encontrar-mo-nos junto ao camião onde funcionava a sala das Conferências de Imprensa. Para lá me desloquei mas não pude entrar. Apesar de vários colegas terem tentado dizer ao segurança que eu podia entrar, o home foi inflexível: «Aqui... só jornalistas!»
Jamais eu faria uso dos meus documentos para entrar ali. A não ser, se ele mos tivesse pedido para ver se me deixava entrar ou não. Não o fez. Mas tudo bem. Se não tinha o "crachat" ao pescoço é porque não pertencia ali.

O mesmo aconteceu na entrada para a zona do pódio, onde ainda fiz intenção de entrar mas da qual me afastei ao ver que o centro de todas as atenções era o senhor José Castelo Branco. A esse não barraram a entrada, como me fizeram mais tarde, já depois da cerimónia de pódio e quando só queria ir ter com os meus companheiros de A BOLA que cobriam a corrida. Acabei por entrar, sim senhor, mas porque o Joaquim Gomes deixou a pessoa com quem estava a falar e me veio buscar quando eu já me afastava.

Ao contrário do que possam estar a pensar, EU não sou a personagem desta história e os exemplos atrás até são de reconhecimento pelo trabalho dos homens da segurança. Dizem-lhes: «Aqui e ali só entram estes...» e eles cumprem. Óptimo. Nada contra.

Toda esta lenga-lenga para chegar aonde quero. Ao objectivo desta crónica.
De entre os vários homens que compõem a equipa de seguranças, deu para ver na televisão que há dois com uma missão bem específica: escoltar o vencedor da etapa, afastando-o dos chatos dos jormalistas. Ok. Já escrevi lá atrás que também eu corri atrás deles, mas hoje mudei de ideias e acho perfeitamente disparatado o querer-se que um corredor, depois de 180 km e de um sprint a 70 à hora, diga seja o que fôr com o mínimo de discernimento. Até porque depois há um espaço para uma conferência de Imprensa. E que interesse terá, seja para quem fôr, ouvir um corredor que apenas rolou no pelotão mas porque, sendo o que está mais à mão, não escapa ao microfone quase a esborrachar-lhe o nariz?

Agora é que vem a verdadeira questão. Aquilo que originou este artigo.

Dizem aos homens: «Vocês vão a correr (e eles vão) apanham o vencedor e trazem-no para aqui e não deixam ninguém chegar ao pé...»
E eles querem fazer isso mesmo. São funcionários da empresa, querem fazer o que lhes é mandado para que o chefe, e depois o próprio patrão, não tenham nada a dizer do seu trabalho. Pudera. Não é fácil arranjar emprego nos dias de hoje.
Mas, por exemplo, na etapa do Fundão, o pobre do Nentcho Dimitrov, técnico adjunto da DUJA-Tavira e búlgaro como Krassimir Vasilev, o vencedor da etapa, quase não conseguiu abraçar o seu corredor, ainda que usasse um equipamento da formação algarvia vestido. Caramba! Para obedeceram ao SEU chefe, os seguranças não deixavam nem um dos CHEFES do corredor cumprimentá-lo. Nem os companheiros de equipa que vinham dar-lhe os parabéns. Também, não levem a coisa tanto à letra.
Para "salvarem" o corredor do sufoco dos jornalistas, "sufocam-no" eles os dois sozinhos!!!
Não era mais fácil por mais uma barreira, ao fundo da zona de desaceleração, com uma porta por onde os corredores passassem? Os corredores e os seus massagistas, que em algumas etapas mal conseguiram chegar ao pé deles? Os jornalistas não passavam dali e pronto!

Algumas chegadas foram "adornadas" destas cenas caricatas. Nem os massagistas, que sempre estão depois da meta para receberem os corredores, dar-lhe uma água, qualquer coisa que eles necessitem, podiam tocar no vencedor da etapa que os dois seguranças se mostraram - creio que eram sempre os mesmos dois - demaziado zelosos.

E dei comigo a pensar "que falta de sensibilidade, se os mandassem tirar a chucha a um bebé eles faziam-no". Sem pensarem. Aquela cena da chegada ao Fundão não me sai da cabeça. Se os homens pudessem andar armados de pistola, ai não sei... mas o pobre do Nentcho, que só queria abraçar o SEU corredor, o seu amigo, o seu compatriota... ainda via uma pistola apontada ao nariz. E houve corredores, que por serem de estatura maior, se viram e desejaram para pedalem ao ritmo da corridinha dos seguranças porque iam todos atrofiados debaixo dos seus braços. Pareciam ladrões apanhados em flagrande delito. E os seguranças polícias.

Revejam lá essa postura. Se fizerem favor.

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