sexta-feira, agosto 18, 2006

213.ª etapa



VOLTA - RESCALDO I


Vamos lá então ao meu balanço desta 68.ª edição da Volta a Portugal.
Tenho que começar por justificar o porquê do atraso. A verdade é que, pela primeira vez em mais de década e meia, eu não estive lá. A distância, sendo boa conselheira, até porque retira alguma emocionalidade à escrita, não deixa de ser distância, principalmente para quem nos últimos 15 anos sempre viveu o acontecimento por dentro.

Claro que fiquei logo com uma ideia, mas faltavam-me dados. Por isso esperei. Não quis e não quero, ser injusto na minha apreciação, e corria sempre o risco de ver “cobradas” algumas análises com um simples – mas “demolidor” – «Tu nem sequer lá estiveste!».

Por isso esperei. Revi imagens, ouvi de novo os comentários e li hoje os “rescaldos” feitos na imprensa desportiva. Não mudei em quase nada a minha opinião, mas há aspectos que, por terem sido reforçados nas análises de quem lá esteve, eu posso abordar mais à vontade.
Gostei muito desta Volta.
Gostei, principalmente, da atitude das equipas portuguesas. Todas elas. Cada uma deu o que tinha para dar, embora seja justo sublinhar que algumas deram mais do que se esperaria delas.

O curioso é que tomo como mote duas coisas escritas por duas pessoas que lá não andaram. Mas que eu “perfilho” porque são dois “instantâneos” que quase por si só definem aquilo a que todos pudemos assistir. Não lhes pedi permissão, mas acho que não ficarão chateados comigo por usar as suas palavras.

Disse-me, em mensagem privada, o Diogo Martins, que «parecia que estive a ver dez clássicas»! Dez corridas de um dia, sem estratégias a prazo, pelo menos visíveis, e que redundaram numa corrida espectacular.

Escreveu o António Dias, num dos fóruns (o
www.pedaladas.info) de ciclismo que podemos consultar (e participar), que «quem faz as corridas espectaculares são os corredores, não o traçado».

Começo então pelo traçado.
Logo que fiquei a saber o mapa desta Volta escrevi aqui que gostava dele. Não mudei de ideias. Foi um traçado muito competitivo – e isso, creio, ficou demonstrado – no qual se nota, mesmo de olhos fechados, o dedo de alguém que sabe muito de ciclismo. Mesmo condicionado em relação aos acordos comerciais, o Joaquim Gomes “desenhou”, não a Volta perfeita, porque essa não existe e porque, creio que todos, incluindo o Joaquim, achamos que sem uma chegada à Torre não há hipóteses de o traçado da Volta se aproximar da perfeição. Mas esta Volta foi muito bem definida.

Volto a recuperar o que disse na altura (vou fazê-lo muitas vezes), o traçado convidava a uma Volta “aberta”. Claro que não vou agora dizer que já esperava que fosse TÃO aberta como foi. Isso surpreendeu-nos a todos. A começar pelo Joaquim Gomes…

Foi, tal como eu tinha previsto, uma Volta que se jogou na rectaguarda do pelotão, nos carros de apoio. O que aconteceu e, principalmente, o que NÃO ACONTECEU, teve origem nas maiores ou menores capacidades tácticas dos directores-desportivos (DD).

Por exemplo – eu sei que é fácil falar depois de as coisas acontecerem, mas o balanço não pode ser feito antes da corrida – foi notória a estratégia da Maia-Milaneza que fez do “minar” da auto-confiança da LA Alumínios – exactamente como fizera no Troféu Joaquim Agostinho – a base a partir da qual tentaria construir espaço para si própria. Não vale? Claro que vale. Cada um joga os trunfos que tem.

Em relação à volta da equipa de Vítor Paulo Branco e Américo Silva, não percebo como não houve alguém – principalmente os mais velhos - que não tenha visto a similitude entre o que lhe aconteceu e o que aconteceu durante vários anos com a Sicasal. A equipa de Vila Franca do Rosário era – foi quase sempre – a autêntica “selecção nacional”, tendo nos seus quadros os melhores corredores portugueses reforçados com reais valores contratados no estrangeiro, contudo, nos dez anos que esteve no pelotão SÓ GANHOU UMA VOLTA. E conheceu vários directores-desportivos. O que aconteceu então, e parece estar a repetir-se com a LA, é que não conseguem “desligar” daquilo que a concorrência faz ou deixa de fazer. Até parece que monta o seu plano de acção em função do que é previsível os adversários fazerem e, actuando estes de forma diferente ao previsto, não existe o chamado… “plano B”.

A LA Alumínios trabalhou incansavelmente, deu o peito à luta e a cara ao vento mas, quanto a proveitos… tendo em conta o que dela se esperava, ficou aquém do que se lhe "exigia". É que o “tribunal” da opinião pública é exigente e pede-se à equipa mais forte que ganhe tudo… A Sicasal, ou as pessoas que trabalharam na Sicasal, sabem bem do que eu estou a falar.

Curiosamente, nos anos em que a Maia dominou claramente o pelotão… não falhou. Mas não se esqueçam que a Maia só ganhou a sua primeira volta em 2001 e, nomeadamente na altura em que tinha nas suas fileiras o Zé Azevedo, pediu-se-lhe muito, mas resultados na Volta nem vê-los!...

Há circunstâncias que acabam sempre por condicionar a corrida dos apresentados como favoritos, daí o facto de haver quem prefira não ser “penalizado” com o ónus de “ter de ganhar”. Eu percebo porquê.

Não vou fazer uma apreciação equipa a equipa, até porque, como deixei num artigo escrito há dois ou três dias, não se podem julgar todos pela mesma bitola. Mais do que isso, há circunstâncias atenuantes que quase sempre escapam ao grande público mas que um analista não deve ignorar.

Dou um exemplo.
A equipa de José Augusto Silva, um técnico arguto, com sentido estratégico e que tem sabido nos últimos anos mostrar que é um dos bons DD do nosso pelotão levando corredores da segunda linha a ganhar etapas e até a vestir a camisola amarela… este ano foi infeliz.
Curiosamente, logo no ano em que parece que todas as outras equipas “jogaram” à Zé Augusto.

O facto de ter um plantel muito curto, ao que teremos de lhe juntar a tardia incorporação de Victoriano Fernandez, os problemas burocráticos que retiveram na Colômbia o Jeobany Chacón, a lesão, grave, de Paulo Barroso e depois a infelicidade de perder também Pedro Costa, afinal, a única “arma” de que dispunha, logo na primeira etapa… deixou a equipa arrasada. Que é que se pode pedir a um técnico de uma equipa pequena que tem de lidar com todas estas contrariedades?
Foi com grande pena minha – até pela amizade que nos une – que assisti à pálida prestação da equipa vitoriana e espero, sinceramente, que não deixe de ser dada ao Zé Augusto uma segunda oportunidade. Seria lamentável que se avaliasse a existência da equipa apenas pelo que aconteceu na Volta, tendo os seus responsáveis pleno conhecimento de tudo aquilo que atrás deixei escrito.
Seria como exigir a uma equipa da Divisão de Honra, sem o guarda-redes titular, sem o capitão, sem o habitual organizador de jogo a meio-campo e sem o seu único ponta de lança, fosse ganhar a casa do FC Porto. Toda a gente tem o direito de sonhar, mas convém que, nestas situações, se olhe para a realidade e com os olhos bem abertos. Não há milagres.

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