segunda-feira, julho 24, 2006

165.ª etapa



UMA VEZ MAIS, OBRIGADO POR TUDO ZÉ!



Palavras simples, transbordando honestidade - não se esperava outra coisa - não fugindo às responsabilidades. Às que assumira e às que lhe quiseram colar. Excelente a entrevista de José Azevedo a A BOLA, na edição de hoje. Autêntico abrir de coração e, com uma lucidez espantosa, se tivermos em conta que ainda as pernas lhe doiriam de 20 dias em cima da bicicleta, e o coração, de certo apertado por ter a noção de que não fizera a corrida que ele próprio pensara fazer, explica o que aconteceu. Sem tabús.

Este foi o 5.º Tour do . O 19.º lugar conquistado - sim, conquistado - é a sua 3.ª melhor classificação na Grande Boucle. Para muitos, em Portugal, e infelizmente, isso não chegou. Ser crítico tem muito que se lhe diga. Por exemplo, quando se aponta o dedo e se avalia o comportamento de seja quem fôr, devia perguntar-se: se fosse eu teria feito melhor?

Já diz um velho ditado chinês: Nunca esqueças que, quando apontas um dedo a alguém, três dos teus próprios dedos estão a apontar para ti.

O ciclismo é uma disciplina muito própria, diferente de todas as outras. Então numa corrida por etapas é mesmo única. Mais nenhum desporto obriga os atletas a, à custa das suas pernas, fazerem 200 quilómetros hoje, subindo montanhas acima dos 1000 metros (às vezes muito acima), e voltando amanhã e no dia seguinte e no outro (20 dias, nas grandes voltas)...

Num momento de fraqueza não pode deixar de pedalar. Não há paragens de desconto de tempo nem vale a pena atirar-se para o chão obrigando à interrupção do jogo e ganhando uns minutinhos para recuperar ao mesmo tempo que obriga à interrupção do ímpeto atacante do adversário, cerceando os seus objectivos.

Não pode parar, mesmo que lhe doa as pernas e lhe doa ainda mais o coração. Mesmo que a cabeça se recuse a pensar. Não pode parar. E ninguém o pode puxar montanha acima. Terão que ser as suas pernas, fracas - às vezes fugindo às ordens do coração que exige uma pausa para descanso -, a levá-lo.

Quem distribuiu "medalhas" de lata e "cartões vermelhos" directos - estranha esta última simbologia, numa imagem umbilicalmente ligada ao desporto "rei"... - terá percebido isto?

Quem não leu a entrevista do , hoje, n'A BOLA, talvez ainda vá a tempo de comprar o jornal. Não vale a pena tentar noutro qualquer que hoje só há uma entrevista com o .

Lêem-na com atenção e sintam o que o sentiu. Vejam como se sente a mágoa que lhe vai na alma mas, ao mesmo tempo, sinta-se a honestidade das suas palavras. E como não arranja desculpas nem foge com o "rabo à seringa". Esteve, naqueles momentos em que falou com o jornalista, como nos habituou a estar tanto no ciclismo como na vida. Enorme.

Daqui, deste cantinho sem pretenções, mando-te um grande e apertado abraço, . E o meu agradecimento por tudo o que tens feito. Pelo País, por todos nós...

4 comentários:

José Carlos Gomes disse...

Criticar José Azevedo não significa amesquinhá-lo ou beliscar o profissionalismo dele. Dizer que ele fez uma grande corrida e agradecer-lhe é que, na minha opinião, é quase insultuoso. É quase como dizer-lhe: "Coitadinho, não pudeste ir mais além!".

A verdade é que o José Azevedo nem é um coitadinho nem um grande ciclista de nível internacional. É um ciclista jeitoso, que se limitou a aguentar no grupo dos primeiros enquanto pôde e a tentar fazer com que as perdas de tempo não fossem muito substanciais. Foi mal sucedido nas etapas principais. Falhou o seu objectivo para este "Tour". Onde está o drama? Todos falham. Dizê-lo com todas as letras é ofensivo para o José Azevedo? Não me parece. No tempo da "outra senhora" é que as verdades eram ofensivas.

mzmadeira disse...

Ok, José Carlos

vamos lá ver se desenleamos este novelo que, aparentemente (não foste só tu a cha,ar-me a atenção), "enrolei" neste artigo.

Se escrevo "Obrigado por TUDO o que fizeste...", não deve ser lido como "... o que fizeste NESTE Tour". A mim pareceu-me claro mas é evidente que para a maioria estará demasiado viva a memória presente.

O facto de o Zé Azevedo pertencer a um restrito grupo de corredores no qual ainda há quem aponte como candidato à vitória num Tour, e, bem mais importante do que isso, o facto dele já ter conseguido lugares prestigiantes, no Tour e noutras corridas, em 2006 e em anos passados, é, para mim, mais do que suficiente para lhe agradecer por TUDO o que fez, ainda por cima numa altura em que são muitos- e nem todos com "bagagem" reconhecida para o fazer - os que se apostaram em "agarrar-se" ao 19.º lugar (como se ficar entre os 20 melhores num Tour fosse uma coisa vulgar) deste ano e ao facto de ele ter colocado como objectivo o colocar-se entre os 10 primeiros para o zurzir.
Se vamos por este caminho, teremos, no futuro - a começar já na Volta a Portugal -, muita coisa e muita gente a quem distribuir "cartões vermelhos" e "expulsões".
Se há 17 equipas e, pelo menos todos os responsáveis vão apresentar como objectivo o "ganhar uma etapa"... e como só há dez etapas, há sete que têm grandes hipóteses de serem "cartonados".

Por estas e por outras - embora eu já o desconfiasse - é que percebo agora a razão pela qual um dos portugueses com uma carreira das mais sem mácula que se possa imaginar não mereceu - nem merece ainda - por parte dos seus compatriotas o mínimo dos reconhecimentos. É que ele não ganhou nada. Fálo do Orlando Rodrigues, peça chave na estratégia da Banesto, fosse qual fosse - e ainda foram alguns - os chefes-de-fila para quem teve de trabalhar.

Mas nós, um povo "habituado" a ganhar tudo o que nos aparece à frente, não aceitamos nem perdoamos a quem "não cumpre os seus próprios objectivos".

mzmadeira disse...

Em relação à questão dos "objectivos" creio estar tudo dito, pelo próprio José Azevedo, ontem na entrevista a A BOLA e hoje, noutra entrevista, desta vez nas páginas d'O JOGO.
Se ele diz que falhou no seu objectivo, tudo o resto é chover no molhado.

Jorge-Vieira disse...

Quem conhece o José Azevedo, sabe que ele é incapaz de esconder aquilo que seja, não é por acaso que toda a gente o considera de um homem com H muito, mas muito grande, eu diria mais, não só o H mas todas as restantes letras.
Não tive a opurtunidade de ontem conseguir adquirir A Bola, mas li todas as entrevistas que o nosso Zé foi dando ao enviado de A Bola durante todas as etapas do Tour, e por isso nada me surpreende aquilo que ele diz sobrer os objectivos traçados e que não foram atingidos.
Nas reportagens que fomos lendo diariamente, mesmo naquelas que mais se esperava dele, ele sempre foi honesto, frontal e acima de tudo dizia o que lhe ia na alma, e quando não dá mais, não dá mais mesmo, é assim o nosso Zé.
O nosso Zé tem um estatuto no ciclismo que o poderiam fazer encontrar desculpas para isto e para aquilo, o nosso Zé é um nome grande do ciclismo, neste momento o nosso maior em Portugal, estatuto esse que o poderiam levar a vedetismos exarcebados e com isso não reconhecer um fracasso que recaiu sobre esta sua participação. Isto porque à partida quase todos os grandes nomes foram excluidos por causa da operação Puerto, e com isso o nosso Zé ganhou ainda mais um estatuto de potencial vencedor, ou até mesmo de um top 3, mas tal não aconteceu, o nosso Zé esteve menos bem, bem como a equipa que esteve com ele.
Nem tudo foi tão mau como possamos pintar, 19º lugar não é para todos, chegar sempre ao fim de todos os Tours que participou, estar em duas vitorias do mitico Armstrong, só está ao nivel de grandes campeões, o nosso Zé é um campeão, por isso:

Obrigado Zé por tudo o que tens feito e trazido de bom para o nosso ciclismo.