sexta-feira, maio 25, 2007

555.ª etapa


JÁ ALGUÉM PENSOU QUE A “CULPA” PODE ESTAR
… NA “BASE” DAQUILO A QUE QUEREM CHAMAR ESPECTÁCULO?

A (grave) situação que hoje em dia podemos perceber está a acontecer no Ciclismo, a nível mundial, por mais que os mais “puros de sentimentos” – para não lhes chamar mesmo ingénuos – possam não querer aceitar, só difere do que sempre aconteceu na mesma proporção em que, por exemplo, o peso das bicicletas evoluiu dos 12 para os 3,5 quilogramas de peso.
Chocante, não é?

Chocante, para mim, é a absurda posição assumida por quem de ciclismo só sabe que se corre montado numa bicicleta.

Queimando o tempo, que é a única coisa que actualmente me sobra, em ciosas buscas através da net, identifico dezenas de sítios onde simples adeptos alternam sisudos julgamentos, mesmo em relação àqueles que já foram os seus ídolos - e que hoje, em carreirinho, se apresentam ante a opinião pública a assumirem que sim, que recorreram a produtos e práticas interditas pelos regulamentos - com a elevação a autênticos altares daquilo a que chamam espectáculo e que se concentram sempre nos mesmos pontos.

Num descarregar da própria consciência, e para não serem julgados coniventes, mal os corredores são atados ao pelourinho apressam-se a ser os primeiros a atirar a primeira pedra. É uma questão sociológica, para a qual não estou habilitado a arriscar sejam que “bitaites” forem.

Constacto, e é essa a verdade, que os mesmos que há dez, cinco, três… um ano, três meses atrás… etronizavam certos nomes, hoje, quando o castelo de areia parece não aguentar, em definitivo, o arremesso das marés, são os mesmos que, na primeira fila, procuram mostrar que “desde pequeninos” sempre foram contra essas práticas ilícitas, aquelas que, cada vez mais apertado o cerco, os ídolos de outrora estão agora, cada dia um, a vir publicamente confessar.

Não tenho formação em sociologia mas creio que qualquer formado nesta área o explicaria exactamente da mesma forma em que eu o penso. Há, por parte do adepto do ciclismo, mesmo que o não queiram assumir – mais do que isso, mesmo que o neguem –, um latente sentimento de culpa.

E chamo a atenção para um artigo que escrevi aqui há dois ou três dias.
Na verdade, os primeiros a exigirem espectáculo, os primeiros que na comodidade do seu sofá, na sua sala de estar com ar condicionado ou simples ventoínha, vibram, diria, quase até ao virtual orgasmo – no sentido figurativo de momento de prazer extremo – com o sofrimento de simples homens, como eles que, derramando suor e lágrimas, também sangue, às vezes, vão para além do humanamente julgado possível, são os primeiros a virem, depois, cruxificá-los.

É - na primeira parte da teoria exposta - a transferência, para outro, daquilo que gostariam ser capazes de fazer. Qualquer psicólogo o confirmará.

(Sou gordo, tenho uma vida sedentária, não subo as escadas, mesmo que tenha de esperar dez minutos pelo elevador para subir ao primeiro andar, mas o meu coração bate ao ritmo das pedaladas de um qualquer Roberto Heras. E quando ele humilha os adversários, numa chegada em alto, com zero graus de temperatura ambiente, rasgando um nevoeiro que para mim chegaria como argumento para não sair de casa… a vitória dele é a minha vitória. E sinto-me no lugar dele, no pódio. Sinto as palmas como se fossem para mim. Os beijinhos das meninas do pódio como se mos fossem dados a mim… e, ainda que inconscientemente, mexo-me no meu sofá anatómico impaciente porque ele, de mãos enregeladas, não abre a garrafa do espumoso à primeira vez. E, quando desligo a televisão, sinto-me muito mais homem. Estou de bem comigo. Como se tivesse sido eu a protagonizar aqueles momentos que não mais vou esquecer.)

Algumas semanas depois – e só estou a usar o caso do Heras como exemplo – sabe-se que o gajo acusara doping.

Filho da mãe!Batoteiro!

Os sentimentos invertem-se e, se tiver possibilidade, lá estarei na tal primeira linha para não perder a oportunidade de lhe atirar uma das primeiras pedras, nesta versão pós-moderna da recuperada inquisição.

Afinal, se és melhor do que eu… só o podes ser porque fizeste batota!
.../...

Não há nada que ligue esta gentalha ao ciclismo. Nada mais do que aquilo que atrás tentei exemplificar e que, creio não precisar dizer mais nada, é apenas… doentio.
Revela frustrações pessoais. Revela falta de carácter
E revela total desconhecimento do que é o Ciclismo!

Por mais bonito que seja o sítio na internet que criou, ou os comentários que, do alto de uma sabedoria que não tem, debita sempre que lhe dá na gana.

É este – podem crer – o retrato-tipo do adepto do Ciclismo, hoje em dia.
Com uma curiosa nuance em relação aos adeptos de outras modalidades. Mas aqui, uma vez mais, seriam necessárias as análises de psicólogos e sociólogos.

O noticiário fornecido pela Comunicação Social deixou de ser importante.
Primeiro, porque a CS desinvestiu na cobertura do fenómeno Ciclismo. Depois porque, mesmo os que ainda resistem, sem perceberem que o “filme da corrida” a partir do qual constroem as suas crónicas, está on-line e que os mais acérrimos adeptos o seguem minuto a minuto.
Acho que advém daí, também, o descrédito em que os últimos resistentes, enquanto jornalistas de ciclismo, conseguiram cair.
Velhos hábitos, de quando, mesmo já na meta, se fingia estar no corpo da corrida dando pormenores que mais ninguém podia saber…

Não se é velho por se contarem muitos anos de vida.
É-se-o por não se ser capaz de mostrar que ainda não se está acabado.
Esse é um dos problemas da CS.
Os novos não sabem e os mais antigos fazem as coisas como sempre fizeram.
Sem se darem conta que muita coisa mudou.

Mas este artigo visa principalmente os adeptos do sofá.

Aqueles que etronizam qualquer um como herói e depois, arrebatados ao seu idílico sonho de perfeição, não se contêm e regressam à sua simples qualidade de bestas irracionais. E o bestas vai aqui como sinónimo de animal. E o Homem não é mais do que… mais um animal. Ainda por cima pensante. O que quer dizer que a simplitude daquilo a que chamamos instinto pode ser maldosamente deturpada.

Porque enquanto pensadores, podemos pensar o que nos dá mais jeito.

Mas voltando, muito atrás, neste longo raciocínio, àqueles que insistem em insinuar-se como modelos de virtudes – fazendo contraponto com os Corredores, que, no espírito desses mesmo, a cada dia que passa, mais se transformam em batoteiros – eu deixo aqui uma sugestão.

Mas, por favor, mesmo que não tenham levado a sério alguns dos considerandos atrás expostos, tomem esta sugestão como uma possível ajuda – aquela que os simples adeptos podem dar – para a reabilitação do Ciclismo.

Fiquemos por Portugal...

Façam “greve” às subidas da Senhora da Graça e da Torre, na próxima Volta a Portugal!
É isso mesmo…
Não vão lá.

Não contribuam para que os corredores sintam necessidade de dar espectáculo, logo, sintam necessidade de recorrer a produtos e métodos proíbidos.
Porque é por vocês que eles o fazem.

AH!... NÃO SE TINHAM DADO CONTA?!!!...

Eles são profissionais. Têm um emprego. Têm um ordenado fixo. Não precisam chegar ao alto da Torre a espumar pela boca, à beira de um esgotamento físico e emocional.

É verdade. FAZEM-NO por vocês. Adeptos.

Por respeito para convosco.
Porque viajaram quilómetros. Porque dormiram ao relento.
Embora eu saiba que as bjecas e as febras “pesam” mais que a corrida.
Eles também o sabem, mas querem acreditar que vocês foram para lá para os ver.

E por vocês vão além do limite.

É verdade. Bastar-lhes-ia completar a etapa para que o patrão lhes pagasse o ordenado.

Se se excedem… É por vocês.

Exactamente os mesmo que agora se acotevelam para ganharem espaço na primeira fila de modo a poderem… atirar-lhes pedras.

Pelo menos… pensem nisto.

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