sexta-feira, julho 20, 2007

669.ª etapa


MORTO À NASCENÇA

A primeira notícia relativa à intenção de se avançar, para a Volta a Portugal, com um Código de Ética – presumo que inspirado na Carta Ética que foi imposta ao pelotão, sob a pena de quem a não assinasse não pudesse correr o Tour que está a desenrolar-se – surgiu na imprensa (no jornal O Jogo) em 12 de Junho passado.

Aliás, nessa notícia (página 42 da edição daquele jornal, no dia 12 de Junho) o que se dava a entender era que a iniciativa teria sido “promovida a pedido da Organização da Volta a Portugal”. O que parece, cinco semanas depois, que não terá sido bem assim. A verdade é que não mais a João Lagos Sports/PAD apareceu em qualquer desenvolvimento da mesma, passando a autoria da proposta, então anunciada como pronta para ser discutida, a pertencer à Associação Nacional de Equipas de Ciclismo Profissional (ANECP).

O que não deixa de ser estranho, mas que se encaixa na ideia que atrás deixei. A Carta Ética, para o Tour, também teve o patrocínio da AIGCP (Associação Internacional de Equipas Profissionais.

No dia 13 de Junho, ainda no mesmo jornal (O Jogo), desenvolvia-se a notícia, sublinhando quatro pontos fulcrais. A realização de testes de hematócrito nas 48 horas que antecedem a corrida; a entrega, por parte dos corredores, de duas análises sanguíneas (a realizar a 15 e a 30 de Julho); a figura (a primeira coisa a gerar polémica) do “atleta sob suspeição” e a co-responsabilização – com solidariedade em caso de impedimento de qualquer dos seus atletas – dos directores-desportivos.
Tudo estava, contudo, ainda pendente de uma reunião que juntasse todos os interessados, ou os seus representantes, para ser mais correcto.

A 14 de Junho, A BOLA junta-se na divulgação da mesma notícia. A notícia tem pontos obscuros. Nomeadamente quando revela que “as equipas rejeitaram a proposta da ANECP" (a sua própria associação!!!) mas também anunciava que se preparava uma reunião com todas as partes interessadas, acrescentando a FPC ao quadro. O que é normal, não só por se tratar da Instituição que gere todo o Ciclismo nacional, mas também porque, embora há muito delegue noutras instituições a realização da Volta, não deixa de ser a responsável máxima. O que é que a notícia trazia de novo? Que esse compromisso, mal fosse assinado, englobaria também a possibilidade de vincular os seus signatários ao que pudesse vir a acontecer em prováveis controlos fora de competição.

Para além disso, a ANECP, na voz do seu presidente, reclamava a necessidade de “se acabar com a suspeição no Ciclismo”, sublinhando, e muito bem, que “a modalidade ser a mais controlada e, relativamente ao número de controlos, ser das que menor percentagem tem de positivos”. Não foram estas, exactamente as palavras de José Santos, mas é esta a ideia [ver A BOLA de 14 de Junho].

No mesmo texto, Paulo Couto, presidente da Associação Portuguesa de Corredores Profissionais (APCP), vincava que “há ainda situações a clarificar, mas concordamos com o essencial apresentado na reunião”.

Mas eu sei que a APCP preparou um documento com algumas alterações ao original e que considerava “não negociáveis”.

O Record só entrou em cena um dia depois de A BOLA, três, depois de a novidade ter sido avançada pel’O Jogo. E já trazia matéria nova, nomeadamente, citava partes do documento que a APCP queria ver aprovadas. Como a extensão até às 48 horas para que um Corredor que eventualmente falhasse um controlo fora de competição, pudesse justificar esa ausência. E ao Record José Santos já disse que era favorável “ao estabelecimento de horários fixos” para esses mesmos controlos fora de competição. O que era uma das pretensões da APCP. E dizia mais. Que “os directores-desportivos das equipas profissionais não se opõem, na generalidade, a que o impedimento por suspeição se estenda a eles próprios”.

Foi isto o que pudemos saber pela Imprensa, há pouco mais de um mês atrás.

Mas eu sei que 15 dias antes de a primeira notícia sobre este tema ter vindo a público a APCP já questionava, digamos… a pressa com que se estava a querer avançar.

Em documento datado de 29 de Maio, 15 dias antes da primeira notícia nos jornais, e dirigido ao presidente da ANECP, a APCP defendia – sem se opôr ao avanço para a ratificação do tal Código de Ética – que este deveria ser regulamentado pela FPC, depois de ouvidas as partes interessadas e aprovado por maioria em órgão legitimo. Que é a Assembleia-geral da própria FPC.

Descomplicando: o órgão representativo dos Corredores até estava de acordo, mas torcia o nariz a decisões ad-hoc, manifestando o seu desejo de ver o documento aprovado oficialmente.

E levantava questões que foram mantidas encobertas.
Por exemplo, que os corredores estrangeiros, a militar em equipas portuguesas tivessem, obrigatoriamente que estar em território nacional a partir de 15 de Julho. Três semanas antes do início da Volta.

Curiosamente, e porque a aplicar-se isso teriam de ser as respectivas equipas a arcar com as despesas de alojamento e alimentação dos mesmos, a ANECP, ficou calada.

E, logo nessa data, a APCP declarou que rejeitava, na sua forma e conteúdo [naquela forma e conteúdo], a proposta em discussão em relação ao Código de Ética. Mas mantinha o seu apoio à proposta de o CNAD, no que respeita à realização de controlos sanguíneos a TODAS as equipas nos dois dias anteriores ao início da Volta a Portugal.

Afinal de contas, o que acontece com as Três Grandes: Giro, Tour e Vuelta.

Entretanto, e a 15 deste mês, A BOLA, que tivera acesso ao documento, publica aquilo que parecia ser o texto final do Código de Ética. Com uma grande novidade. Cito: “O Código de Ética aprovado pelas equipas profissionais…”

Pelas equipas? E a FPC? E a João Lagos Sports/PAD? E a APCP?
Onde, em que atalho do caminho, se perderam estas três instituições interessadas?

- E as equipas decidemhoje sei que não houve unanimidade – que os corredores devem enviar na segunda quinzena de Julho o resultado das análises.
(A APCP sempre concordou com isto, mas acha que deveriam ser as equipas a suportar o custo dessas análises, o que não sei, de facto, se foi o que aconteceu ou não.)

- E as equipas decidem que a FPC, através da UCI, deve garantir análises sanguíneas antes do início da Volta a Portugal.
(Quando a UCI nunca fez isso em relação à maioria das provas da categoria da Volta. O que deixa a batata quente nas mãos da própria FPC…)

- Que os Corredores devem actualizar os endereços e locais de estágio…
(Não vale a pena transcrever todo o artigo porque… isto já está regulamentado!!!)

- Que os Corredores e respectivos DD serão responsáveis pela realização dos controlos [fora de competição] no prazo máximo de 24 horas após a notificação.
(Quando a APCP já solicitara a alteração para as 48 horas…)

- Se o controlo não fôr feito no prazo mencionado, Corredores e DD serão suspensos e impedidos de participar na Volta a Portugal…
(Quando a APCP já reivindicara a possibilidade de justificação para eventuais ausências…)

- Que a FPC, através (outra vez!) da UCI estudar a hipótese de efectuar controlos sanguíneos durante a Volta, com incidência ao dia a seguir do de descanso (???)

- Que os corredores estrangeiros…/… devem indicar o local de residência podendo ser controlados fora de Portugal.

Perguntem ao Zé Azevedo, corredor emigrado entre 2001 e 2006, se foi ou não controlado fora de competição. Sem ser necessária nenhuma rábula destas.

E depois vem a notícia: “As equipas portuguesas não concordam com a presença de Corredores presumivelmente implicados na Operação Puerto na Volta a Portugal!...”

Entretanto, a APCP faz sair novo comunicado e acusa:
“O texto do Código de Ética tem sofrido sucessivas alterações que não reflectem a reunião entre os visados no texto”;
E faz uma constatação:
“O Código de Ética não é aplicável a todos os corredores participantes na Volta”;
E chama a atenção:
“Não pode haver suspensão sem justificação”;
E defende:
“Não está no Código de Ética consagrado o direito à defesa…/… violando-se o artigo 22 do Dec.-Lei n.º 183/97, de 26 de Julho, com a redacção dada pela Lei n.º 152/99, de 14 de Setembro e pela Lei n.º 192/2002, de 25 de Setembro”;
Finalmente:
“Não pode no Código de Ética haver caminho aberto para um poder discricionário”.

Então, o que é que podemos retirar deste “Código de Ética”?
Exactamente… começou por ser uma boa ideia que, trabalhada, poderia tornar-se numa excelente ferramenta de trabalho mas que, algures – porque é que eu não fico surpreendido? – descarrilou e acabou numa coisa não adjectivável, com todo o ar de ter tido um único redactor e que os demais – com uma excepção, com uma excepção – assinaram de cruz.

Conseguiu-se o verdadeiro feito de “matar o próprio filho”.

E agora quem é que lhe reconhece credibilidade?

Mas quem anda nisto ao tempo que eu ando… já não fica surpreendido.
Nada contra o homem, mas de cada vez que pretendeu ser dirigente… falhou redondamente. E comete hoje os mesmos erros que há 20 anos.

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