terça-feira, julho 24, 2007

707.ª etapa


O INSUSTENTÁVEL PESO DA DESCONFIANÇA

O que sentirá um corredor quando, no pouco tempo de descanso que tem no dia de descanso, se senta num dos sofás do átrio do hotel onde a sua equipa está instalada, estica as pernas, cansadas de 18 dias de corridas e viagens, depois de na véspera ter tido que resistir com tudo o que tinha para não ver o seu principal rival ganhar-lhe tempo, dizia eu, se senta num dos sofás no átrio do hotel onde está instalado, estica o braço, agarra num jornal, folheia-o até às páginas sobre o Tour e lê isto:

“Com toda a especulação à sua volta seria melhor que outro qualquer vencesse. A última coisa que o ciclismo precisa é de mais especulações sobre doping.”

E o que terá sentido… o Michael Rasmussen. Mesmo depois de ir até ao fim da notícia onde o autor daquela declaração acaba por reconhecer que ele, Rasmussen, “não quebrou qualquer regra” e “merece o benefício da dúvida”?

E quem é que proferiu tão desditoso comentário?
O senhor Patrick McQuaid. “Só”… o presidente da União Ciclista Internacional.

Apesar de “não ter quebrado qualquer regra” e de “merecer o benefício da dúvida” – não seria o Direito à presunção de inocência? -, o “melhor”, para a UCI, é que o homem que até agora gastou menos tempo que os demais a percorrer os mesmos quilómetros, por planícies e montanhas, em contra-relógios ou resistindo, nas mais duras subidas, aos constantes ataques dos rivais, na defesa da sua camisola amarela… NÃO ganhe o Tour.
Por rumores. Por puros rumores.

Atentem, por favor, todos a isto que vou escrever: qualquer um dos milhões de OCS espalhados pelos quatro cantos do Mundo pode, nos dias de hoje, acabar com a carreira de um Corredor.
De um qualquer Corredor.
Basta registar, em gravação, em vídeo ou num bloco, com uma simples esferográfica, as declarações de quem o queira destruir.

E isto é muito grave.
E quando o presidente da UCI, mesmo reconhecendo que um corredor – que por acaso é o líder do Tour – “não quebrou qualquer regra” e “merece o benefício da dúvida”… vem dizer que “seria melhor que outro qualquer vencesse”, por causa de toda a especulação que já o persegue, embora ainda estejamos a cinco dias dos Campos Elísios, digam-me lá se não são levados a pensar o mesmo que eu logo pensei:

Para a União Ciclista Internacional – e não me custa acreditar que a Organização do Tour pensará a mesma coisa – o problema, o grande problema, não está no doping.
Está nas notícias sobre o doping. Quer elas tenham, ou não, nomes de Corredores.
A preocupação não é a luta contra o doping
É que se saiba que há doping.
E até já os rumores preocupam.

Mesmo reconhecendo que Rasmussen “não quebrou qualquer regra” e “merece o benefício da dúvida” – sendo que, nos controlos a que, desde que é líder da prova, é sujeito todos os dias não revelaram qualquer “trafulhice” por parte do dinamarquês – “o melhor era ser outro a ganhar”!
E como se sentirá o Michael Rasmussen, depois de ter lido esta… demonstração de desconfiança?

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