terça-feira, outubro 17, 2006

272.ª etapa


PODEMOS CONTINUAR A TENTAR SOBREVIVER... OU COMEÇAR UMA VIDA NOVA!

O que vou escrever neste artigo já foi dito. Um pouco aqui… um pouco ali…
Como é que o nosso ciclismo há-de fazer para sair da cêpa torta?
Mas atenção! Desengane-se quem julga que estamos sózinhos na “bagunçada”. Está a acontecer o mesmo em todo o lado e, depois que o ProTour se tornou realidade as coisas… só pioraram.

Estão errados todos os que pensam que a crise é um exclusivo nosso, como o estão – principalmente os mais novos – quando julgam que isto já foi muito melhor.
Mentira.
Nunca foi melhor. E por isso não está a ser pior agora.

O ciclismo profissional, em Portugal – e não podemos recuar mais do que 60 anos para não sair fora desta realidade – sempre foi algo de sazonal, se olharmos ao ciclismo de uma forma global. Em Portugal. Só estou a falar de Portugal!

Infelizmente é pouca a bibliografia na qual nos possamos apoiar – ok, sou eu que estou a dizer… EM QUE EU ME POSSA APOIAR – para sustentar o que digo. Mas é a verdade.

Benfica, Sporting, FC Porto, Sangalhos – nos seus melhores tempos – e depois a Ambar e a Coelima, mais o Ginásio de Tavira, tinham, de facto equipas profissionais. Mas, e as outras? Quantos, mas quantos foram os corredores que fizeram a Volta a Portugal – neste intervalo de tempo que vai desde aí os anos 40 até aos 70 do século passado – não metiam férias nos seus empregos reais para irem correr a Volta?

E, em relação à Comunicação Social – está-se agora a discutir isso no Cyclolusitano – será muito diferente a cobertura que hoje se dá ao ciclismo. Em relação ao que antes se fez? Na questão da qualidade estou de acordo que estamos muito pior.
Um jornalista começava a “fazer” a Volta e ficava durante dez, 20… 30 anos a fazer anualmente a Volta.
Agora há quem vá para casa a meio com uma insolação…
E todos os anos aparecem caras novas. Alguns até desconhecem que uma bicicleta tem mais desdobramentos de velocidades que um automóvel. Alguns até desconhecem que uma bicicleta tem mudanças!!!

Mas o que é que a CS “dava” de ciclismo há 30 anos?
Era a Volta, a Volta e… a Volta.
Depois apareceram uns grandes prémios – como o da Robiallac, por exemplo – e os jornais também passaram a falar deles.
E o ciclismo ganhava estatuto de modalidade maior porque no Verão não havia futebol.
Não havia mesmo!
O defeso era um “deserto” que, mesmo apenas trissemanários, os jornais desportivos TINHAM que virar-se para outro lado.

Curiosamente, e à imagem do que aconteceu em França, com o Tour, em Itália, com o Giro, e em Espanha, com a Vuelta, também a Volta a Portugal nasceu da vontade de um punhado de homens ligados aos jornais…

Mas estamos como estamos e é a partir disto que teremos que construir um novo ciclismo. Aquilo que muitos esperamos, mas para o qual poucos parecem estar dispostos a contribuir.

O “edifício” do ciclismo português tem que ser reconstruído, senão de raíz, aproveitando muito pouco do que hoje existe.
Olhemo-lo como se fosse um antigo palacete oitocentista, de bonita fachada mas de interior completamente em ruínas. Queremos manter-lhe a achada? Muito bem, concordo, por mais que não seja porque dou valor ao património construído pelos nossos antepassados.

Por isso defendo que devemos “escorar” a tal fachada, as paredes-mestras e… mais nada! Tudo o resto tem de ir abaixo e, no interior daquilo que foi até hoje, construamos então um novo ciclismo.

Para que amanhã tenhamos corredores – que já não nascem de geração expontânea, como o Joaquim Agostinho, ou antes dele o Alves Barbosa, o Ribeiro da Silva, o José Maria Nicolau e o Alfredo Trindade, só para não ir ao princípio e relembrar José Bento Pessoa – há que apostar forte nas escolas. Nas escolas de ciclismo, mas também nas outras, nas escolas, na sua definição geral.
Apoie-se, depois, os clubes que apostam nas categorias jovens. Embora todos saibamos que este “amor” está indelevelmente associado ao facto de, nesses mesmos clubes estarem a “crescer” os “rebentos do papá”. E é por eles que os “papás” fazem sacrifícios. Tentemos inverter isso e dotar os clubes com técnicos formados de forma a que o crescimento do jovem corredor seja feito não com intuitos pessoais, mas de uma forma muito mais abrangente.

Para os miúdos que, inevitavelmente, vão crescer, apoiemos a existência de equipas de clube que os absorvam.
Criemos-lhes um calendário à sua medida. Depois, ampliemos esse calendário à medida que eles forem “exigindo” mais. Nos cadetes, nos júniores… nos sub-23.
Criemos uma plataforma entre estes e o profissionalismo. Porque sim. E para que eles mesmo escolham o seu destino. Querem ou não continuar a ser corredores? É que por essa altura das suas vidas têm que fazer as primeiras opções. Tenhamos também alguém, que não o pai, que lhes diga, olhos nos olhos, “tu não vais ser corredor”. Para que ele escolha outro rumo.
Não façamos, à força, dos nossos filhos aquilo que nós gostaríamos de ter sido e nunca chegámos a ser capazes de ser.

Reduzamos o profissionalismo à nossa escala. Que é pequena.

Duas, três equipas no máximo.
Não vão poder correr as nossas provas?
Mas se já tivermos interiorizado que as nossas provas não são para os profissionais… não vai custar tanto assim.

Essas equipas, para além de servirem para mostrar ao Mundo o que de melhor fomos capazes de construir, serão, ao mesmo tempo, o grande objectivo de toda a pirâmide que lhe fica abaixo.
Deixemos os jovens perceberem que, se não forem realmente bons não poderão ser profissionais. E se, chegados a este nível, não provarem que são ainda melhores que os outros, não chegarão à Grande Equipa nacional. O topo da pirâmide.

E essa Grande Equipa nacional será aquela que nos representará no grande circuito europeu, ou no mundial.

Parece difícil?
Não é. Embora eu saiba que há “paredes” que não é fácil mandar abaixo.
Contudo, o “edifício” tem mesmo que ser reconstruído.
Ou cairá por si.

1 comentário:

mzmadeira disse...

Recebi esta mensagem por e-mail e, como já fiz noutras alturas, acedo ao pedido de a colocar aqui. Com o meu obrigado ao João por colaborar.


Caro Amigo,
Respondo assim à etapa 272 pois não sou um ”blogger” registado, Contudo pareceu-me que temos umas ideias ligeirmente diferentes em relação ao desporto amador. Exponho o meu ponto de vista por tópicos para conseguir ser mais conciso e não me perder entre pontos e vírgulas.

Concordo a 200% quando diz que não ha lugar para tantos "profissionais" em portugal, mas, e sabendo bem das diferenças para outros desportos porque não icentivar o "amadorismo". Não me refiro a etapas de 160 km mas sim a etapas de 40 km. Uma "fun marathon" onde velhos e novos possam participar pelo gozo, quando estes estiverem a terminar a etapa dá tempo para ir almoçar e ir logo ver a chegada dos profissionais e semi-profissionais. As pessoas querem ser parte do espectáculo, partir ao lado do candido, porque não? O meu tio tem um grupo de amigos que participa em todas as grandes fun "marathons" (vão a Lisboa, Porto, Espanha, etc., etc.). Eu não tenho dúvidas nenhumas que dada a oportunidade os domingueiros iam aderir.
Quantos mais aderissem maior valor comercial teria o evento... blá, blá, blá.

Quanto maior fosse a quantidade de participantes (espectadores, telespectadores, corredores, etc.) maior seria a probabilidade de aderirem numa próxima e uma vez aderindo a probabilidade de ficar no desporto é maior.

O doping, palavra maldita no desporto e sociedade é resultado de duas coisas.

1.º, quanto mais duras forem as provas mais ciclistas vão aparecer dopados
2.º, quanto mais brandas forem as punições maior serão os infractores

A avaliação que se faz nunca leva em conta o facto de eu, o meu caro amigo, o espanhol de quem falava há uns dias, os tipos do COI, os tipos da UCI... etc., etc. serem, sermos, uma grande cambada de dopados porque quando temos uma noitada de trabalho e ainda aparece mais trabalho (um Alp d'Huez atrás de um col de Madelene) nós bebemos um café, dois ou três e estamos a aumentar a nossa performance, a atrasar a nossa fadiga. A sociedade em geral dopa-se, claro que não estamos a falar de testosterona e afins mas aqui o principio é que está em causa, vamos para além das nossas possibilidades com "aditivos" e no fim se o trabalho ficar bem feito ainda somos bonificados, ninguem nos manda "mijar para o copo" (desculpem a expressão grosseira).

Mudando de tema.

Quanto à competição... é simples eu (e mais 10 milhões) gosto de ver espectáculo e para mim espectáculo são colinas, pavê,montanha (subida e descida) e sprints. As etapas da Volta a Portugal só têm a ultima vertente. E eu digo assim: é possivél fazer uma etapa à “grande volta”, já alguem ouviu falar de uma serrinha chamada Caramulo?? É estranhamente próxima da serra da Estrela e estranhamente não é utilizada na volta. Uma etapa de "alta montanha" pode não ter o apoio das câmaras municipais mas tem mais tempo de emoção, interrompe mais as emissões com fugas e atrasos dos craques, leva mais gente à estrada especialemente se acontecer em todas as edições.

Quanto à formação, o essencial é haver mais praticantes amadores, divulgar cada vez mais o ciclismo enquanto regulador de uma vida saudavel. Quanto mais gente pousar o rabiosque num selim, maior será a probabilidade de aparecer mais gente profissionalizável.

Estas questões que aqui levantei são idênticas aos problemas de todas as modalidades ditas amadores (falta de massa, falta dos “mass” e falta de matéria prima) e a solução para todos é muito semelhante, terem ao contrário do futebol um papel cívico, correr ou jogar por causas, incentivar o desporto pelo bem que faz.

Um abraço…
João Casa Nova