sexta-feira, agosto 10, 2007

775.ª etapa


APENAS UMA HISTÓRIA DE CICLISMO

Hoje tenho uma história para contar.
Uma história de Ciclismo, claro.
Já estive a rever o final da etapa de ontem, na chegada a Fafe.
Já li os jornais desportivos.
Ontem, creio que no Jornal da Volta, que passou cerca da 1 da manhã (que já era hoje, afinal) vi, de raspão, um Corredor que, depois de feito o seu trabalho, ao desviar-se para se recolher nas barreiras foi ao chão. Queda aparatosa. Bicicleta pelo ar…
As imagens que ainda não vira.

No dia anterior só o vira, já levantado, queixoso, a tentar remontar a máquina e seguir para o risco de chegada porque a almofada da não penalização em tempo, em caso de queda nos últimos três quilómetros, não serve para as chegadas em alto.

Nos jornais de ontem já tinha lido que uma ida ao hospital um par de radiografias e o diagnóstico fora… fissura em duas costelas. Também já li fractura, em vez de fissura.
Deve doer, seja qual for o caso.

O que não impediu que ontem ele se tenha apresentado à partida, para correr, em cima de uma bicicleta, em terreno de permanente sobe-e-desce, quase 170 quilómetros.

A etapa desenrolou-se pouco interessante, fotocópia das anteriores. Até nas passagens das principais equipas pela frente do pelotão. E, anulada a fuga, já no empedrado que leva à Praça 25 de Abril, sala de visitas da bonita cidade de Fafe, quando já se esboçava o final da tirada, de repente, marcando o andamento do Camisola Amarela na aproximação à frente da corrida lá ia uma camisola azul carregado da Liberty Seguros.

As rodas das bicicletas saltitam sobre os paralelos irregulares e os corpos dos atletas são basculados numa intensidade proporcional. Não… não podia ser o mesmo homem que na véspera fracturara (ou fissurara) duas costelas. Não naquele piso que faz chocalhar todos os ossos do corpo…

Era! Era o mesmo. Por acaso, até o homem da equipa apontado por quase todos como a opção mais válida para a vitória na Volta, caso o homem por quem ele anda a puxar todos os dias falhe.

Ontem teve direito a um minuto na televisão. Mal disfarçando as lágrimas, pelas dores, certamente, porque deve doer rolar a 70 km/hora, sobre paralelepípedo irregular e com duas costelas fissuradas (ou partidas), ele confessou que não estava bem, dói-lhe quando respira, mal dobra o braço, mas o mais importante é que contam com ele na equipa, que o seu trabalho é aquele e porque o Cândido acaba por ganhar, vale a pena o sacrifício.

Hoje li palavras do Américo Silva que se referem ao encontro, ontem, com esse Corredor, depois de finda a etapa. O Américo confirma que ele chorava de dor, ao ponto de o próprio Américo ter sido obrigado a deixar escapar uma lágrima.

Três curtas passagens nos jornais, coincidentes neste relato.
Três linhas cada uma.

Daqui me inclino respeitosamente perante o Corredor e o Homem.
O seu nome é Hector Guerra.
Um abraço de solidariedade e de incentivo, Hector.

Ele que aqui personaliza todos os Corredores que sofrem em cima de um frágil bicicleta e passam despercebidos. Ao lado da grande informação.
Para que os media se interessem… o melhor é serem apanhados com um positivo num qualquer controlo anti-doping.

2 comentários:

Anónimo disse...

Manuel, agora imagine que se tratava dum corredor cazaque, de uma equipa suíça que tinha acusado positivo num controlo anti-doping numa prova francesa (ok, o Tour). Quanto destaque teria? um ou duas páginas por desportivo, penso eu.

Abraço,
Rui Quinta

mzmadeira disse...

O que a mim entristece, Rui... é que mesmo o Jornal Oficial da Volta está a dar a esta manifestação desportiva que, se fosse possível contabilizá-los, em 11 dias teria mais espectadores do que as 34 jornadas (completas, com todos os jogos) da liga de futebol, tenha o mesmo espaço de um FC Porto-Boavista.

Quando A BOLA foi Jornal Oficial, e isso aconteceu em 2004 e 2005 - acho eu... que já teho lapsos de memória - fazíamos 8 páginas.

A JLSports/PAD vai ter que desinvestir um pouco no acolhimento, almoços, jantares e dormidas de algumas caricaturas de VIP e apostar na divulgação desportiva do evento. Se para tal for necessário investir aí - e sem pruridos -, pagar espaço (que não a independência) que se avance.

A Volta reduzida à crónica sintetizada da etapa e mais duas páginas que são perfeitamente iguais de um jornal para outro... seguindo por sí, está a apostar-se no cavalo errado.

E a questão do doping, sendo pertinente, também é delicada.

O grande problema era se acontecesse um caso positivo, na Volta. Porque, de certeza, pulverizaria, em termos de espaço, o espaço que quem sua a camisola merece.

Tem tudo que ser repensado. E não o pode ser em plena Volta. Tem que ser repensada para o ano. Para os próximos anos.

Os Jornais, hoje em dia, têm concorrência concreta. Os sítios na Internet que dão as notícias na hora.

Vai ser preciso repensar tudo. E isso só pode acontecer enquanto houver jornalistas no activo que vivem o Ciclismo.

Daqui a dois anos não vai haver mais.